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Opinião
18/04/2022 - 06h15
A corrida aos cabos eleitorais
Dirceu Cardoso Gonçalves
 

Com os pré-candidatos já acomodados nos partidos por onde deverão concorrer, chegou agora o sedutor período de conquistar os cabos eleitorais. Quem conseguir arrebatar os melhores disponíveis na praça terá maior chance de vitória. Mas, pela própria natureza da eleição - que permite a cada partido registrar um candidato para cada posto do Executivo em disputa e 150% do número de cadeiras das casas legislativas (neste ano Câmara dos Deputados e Assembleia Legislativa de cada Estado) - a única certeza é de que a maioria dos concorrentes não se elegerá. Isso atende ao principio eleitoral de que os escolhidos serão a síntese da preferência dos votantes.

Para Câmara, composta por 513 deputados, cada um dos 32 partidos com registro no TSE (Tribunal Superior Eleitoral) poderá apresentar até 769 candidatos, um número absurdamente alto, que jamais será preenchido. A mesma proporção se aplica para as Assembleias estaduais e as Câmaras de Vereadores nos anos de eleições municipais.

Por representarem o conjunto da população, existem pré-candidatos de todos os matizes. Gente séria e também não séria mas em condições de passar pelo crivo da legislação eleitoral, notadamente o da ficha limpa, um tanto permissivo para não impedir os que a votaram. Boa parte dos pretendentes não tem recursos e nem estrutura para fazer a campanha. Conquista seus cabos eleitorais prometendo, se eleitos, contemplá-los com cargos de confiança e livre nomeação nas casas legislativas ou no governo dirigido pelos aliados políticos. Os cargos, no entanto, mesmo numerosos, não são suficientes para absorver todos os que ajudam na campanha dos eleitos. Boa parte fica fora e o político e bico doce na hora do convite para a campanha, resta odiado e com a pecha de enganador, entre outros qualificativos. Mais do que malandragem é a deformação do processo eleitoral.

São muitas as histórias de relacionamentos eleitorais que terminaram mal porque assim já começaram. Mas ninguém se mexe para resolver a insustentabilidade. O elevado número de partidos é o primeiro complicador. Além dos já registrados há mais de 70 com pedidos de registro em análise. É um absurdo o que acontece, principalmente a necessidade do lançamento de candidatos que, a priori, sabemos sem qualquer condição de sucesso. Apesar de tudo, escandaliza a população o montante de dinheiro público que se destina tanto à manutenção dos partidos (que deveriam se manter por contribuição dos filiados) e para a realização das campanhas eleitorais.

O resultado de tudo isso é o quadro de desavenças do próprio meio e o favorecimento dos que já têm mandado e concorrem à reeleição em detrimento dos demais. É preciso, em vez de sofisticações, restrições e reservas de mercado - como um percentual de candidaturas a mulheres, negros, índios e outros - se trabalhe pela igualdade e sustentabilidade do processo. Até os próprios partidos, cujo conjunto inchou em vez de crescer, parece já terem entendido que não sobreviverão em número tão elevado e tentam se reunir nas chamadas “federações”. Não consigo atinar qual seria a solução, mas algo tem de ser feito.

Cada vez que vejo a balbúrdia em que se transformou o processo eleitoral, lembro dos anos 50, quando um amigo da família vendeu a máquina de costura da esposa para custear a campanha de vereador. Ele dizia isso com um misto de vaidade e humildade, acabou eleito e revelou-se um grande vereador para a cidade. Precisamos resgatar o processo eleitoral simples e objetivo, onde o eleitor vote nos candidatos de sua preferência e tenha razões para por eles se sentirem representados. A cada eleição que passa, temos ficado mais longe disso.


Nota do Editor: Dirceu Cardoso Gonçalves é tenente da Polícia Militar do Estado de São Paulo e dirigente da ASPOMIL (Associação de Assist. Social dos Policiais Militares de São Paulo).

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