O Jair Bolsonaro tem nas mãos - hoje explicitamente - um dilema que já deve ter rondado seus antecessores e, se não forem tomadas providências eficientes, deverá tolher a autoridade de seus sucessores, mesmo que venha a ganhar as próximas eleições: a nomeação do presidente e diretores da Petrobras. Vazou dos bastidores que instâncias da própria companhia produziram material que inviabilizou a investidura dos executivos que o governo indicou para a presidência da estatal e do seu conselho. De uma forma tão impactante que os próprios escolhidos optaram por declinar do convite. O que pode parecer prova de competência empresarial, de outro lado, pode ser só o corporativismo correndo à solta e reduzindo a ascendência do proprietário - o governo como acionista majoritário - sobre a corporação. Já que produzida internamente, tal força pode representar os interesses dos acionistas privados ou - o pior - do quadro de funcionários, um dos mais bem pagos e cheio de penduricalhos de todo o país. Levantamento do ano passado revela que a Petrobras oferece 52 benefícios diferentes aos seus privilegiados funcionários. Entre eles, gratificação de férias de até 100% do salário, plano de previdência privada e outros exageros. Independente de poder ou não retirar a companhia da obrigatoriedade de seguir os preços internacionais do petróleo, o governo - como dono - não pode ficar à mercê da estrutura que, ao longo dos anos, a própria corporação montou e lhe confere níveis elevados de independência. Sua criação, há 69 anos, deu-se após extensa campanha nacionalista cujo lema era “O petróleo é nosso”. A idéia era que, com uma empresa governamental, poderíamos fazer uma política petrolífera favorável à economia nacional, principalmente que oferecesse combustíveis a preços que garantissem o transporte e não impactasse na inflação. E que também houvesse a exploração do óleo de nosso subsolo de forma a ele trazer o progresso e o bem-estar da população. A empresa funcionou, desenvolveu o setor, mas restou operando exatamente como as corporações privadas, especialmente na política de preços. A grande diferença é que a empresa privada tem de ser sustentável e a estatal, se der prejuízo - que não é o caso da Petrobras - pode receber aporte do Tesouro Nacional para preencher seus buracos de orçamento. Também deve diferir a política de pessoal pois dificilmente uma petrolífera privada daria tantos benefícios ao seu funcionalismo, mesmo pagando bons salários. Não devemos esquecer que toda a mordomia que se proporciona aos empregados de uma estatal ou de órgãos do governo é custeada pela população, através dos preços dos produtos - no caso da empresa estatal - ou diretamente pelos impostos quando se trata do funcionalismo público. Por isso não é difícil pensar que, com o pé mais colocado ao chão, a empresa talvez pudesse praticar política de preços mais favorável à população do que aquela a que temos sido submetidos. É bem verdade que num Estado montado sob a política trabalhista protecionista do Era Vargas, dificilmente se terá como tirar as gorduras que hoje engrossam os holerites da Petrobras e do governo como um todo. Mas é preciso restituir ao governo pelo menos o direito de escolher seus dirigentes sem o risco de esbarrar no corporativismo interno. Talvez, melhor do que manter a petrolífera estatal seja vender as ações e com isso privatizá-la. Quem comprar certamente será do ramo e saberá como lidar com a ilha da fantasia, mesmo diante do protecionismo legal que, por exemplo, impede a redução de salário e ganhos. Lembremos que não é só a Petrobras. Tanto que há, o movimento Brasil Sem Privilégios - que prega a eliminação de gratificações, auxílios (moradia, paletó e outros) a servidores e autoridades e a reversão da economia pára a melhor estruturação dos serviços de atendimento ao público, grande gerador de reclamações. As notícias sobre benesses discutíveis e autoridades e servidores - principalmente os de alto escalão - são recorrentes e escandalizam a sociedade. Com o passar dos anos, as classes dominantes do serviço público atuaram politicamente e conseguiram transformar suas reivindicações em leis que dificilmente serão revogadas. Isso ocorre no funcionalismo federal, estadual e até no municipal. Talvez justifique a elaboração de ampla reforma econômica e, até, a chamada da Constituinte para recolocar as finanças públicas nos eixos... Nota do Editor: Dirceu Cardoso Gonçalves é tenente da Polícia Militar do Estado de São Paulo e dirigente da ASPOMIL (Associação de Assist. Social dos Policiais Militares de São Paulo).
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