Termos acadêmicos existem que servem apenas para colocar muros onde deveria existir campo aberto. Discriminações, evidentemente. Ora, o termo escritor, por exemplo. Na verdade, o que é ser um escritor? Somente aquele que publica livros, ou também aqueles que deixam seus originais nas gavetas, ou também ainda aqueles que escrevam cartas, bilhetes, qualquer tipo de escrito? Quem escreve é escritor, e seja de que tipo de escrita for. Mas não, logo a academia vincula o termo escritor ao livro vai elegendo seus “gênios”. Outro termo vazio, sem fundamentação ou justificativa algum, é o dito “intelectual”. Ora, a intelectualidade vem do termo intelecto, que é o uso da mente, da razão, do pensamento. E pelo que eu sei, todo aquele que não possui distúrbio mental faz uso da razão, do pensamento, do intelecto, e de forma condizente ao seu meio e à necessidade de uso. Mas não, mais uma vez a academia chega para colocar grades, para separar os humanos. Por consequência, basta ter qualquer pífia graduação para ser chamado intelectual, basta ser “doutor” para ser chamado intelectual, basta ser escritor para ser tido como intelectual. Mas o pior é que tais intelectuais fabricados ou impostos pela conveniência, geralmente são tão despreparados que acabam se tornando nas pessoas mais chatas do mundo. Levando o escudo da intelectualidade como se fosse qualquer coisa de serventia, e então passam a ser reis, sábios, mestres, filósofos, os suprassumo do saber e da inteligência. Tornam-se inacessíveis, intocáveis, sempre envoltos em redomas douradas. Contudo, não passam de uns boçais, de uns deseducados, verdadeiros purgantes à vida útil. Achando-se donos da verdade e possuidores da última resposta a tudo, então sequer parecem gente. E quando abrem a boca escolhem precisamente ininteligível, o que não pode ser compreendido, como forma de se fechar ainda mais em sua redoma. Uns idiotas. Diferentemente do que imaginam os vermes em seus fajutos pedestais, a verdadeira sabedoria humana é humilde, é compreensiva, é compartilhada e sempre vai ao encontro do outro, no sentido de ensinar e também aprender. Quem é verdadeiramente sábio ou quem tem elevado nível de conhecimento das realidades do mundo, seja no âmbito metafísico ou cotidiano, sabe muito bem que o saber deve ser visto como algo utilitário e não como escudo para uma suposta intelectualidade. O verdadeiro sábio é comedido, paciente, sem soberbas ou jactâncias. O verdadeiro sábio, diferente do dito “intelectual”, conhece muito bem seus limites do saber, sabe que não sabe tudo. E por isso mesmo tanto colhe como semeia o conhecimento. Estes ditos intelectuais são facilmente reconhecíveis, pois admiram uma mídia para se mostrar. Quando falam, porém, confundem ao invés de ofertar conhecimento. Todo dia na televisão aparece um filósofo, um especialista nisso ou naquilo, um mestre sei lá das quantas, um catedrático do mundo revirado, um acadêmico da tese inexplicável. Nas fotos, aparece tendo estantes ao fundo, com rostos endeusados e olhares dizendo “fique lá que eu fico aqui”, com molduras sombreadas e mãos levando pingentes de ouro à face. As denominações são as mais estapafúrdias, os currículos são intermináveis. Mas quando abre a boca... Quantos mundos existem separando os homens segundo suas hipocrisias? Quantas redomas existem para deixar lá dentro os que nasceram diferentes virados pra lua e lá fora os simplesmente mortais. E mortais estes que são os verdadeiros sábios da terra. Mesmo sem estudo escolar ou de pouca leitura ou escrita, a cada dia escrevem o grande livro da sobrevivência. E na resposta torta, acabrunhada, dizem tudo que a gabolice dita intelectual não sabe dizer nem compreender. Por isso que odeio intelectuais de mídia, de forjadas proclamações, de círculos imortais moribundos ou já mortos. Por isso mesmo que escolho meus próprios intelectuais, aqueles que verdadeiramente têm a ensinar o que eu preciso tanto a aprender: Seu José do Mato, Dona Maria Rezadeira, Minervino Pescador, Tonica Lavadeira, e tantos outros que vivem como letras vivas em livros sábios pelo suor e pelo cansaço. Nota do Editor: Rangel Alves da Costa é poeta e cronista. Mantém o blog Ser tão / Sertão (blograngel-sertao.blogspot.com.br).
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