Sábias as palavras do vice-presidente da República, general Hamilton Mourão. Em lugar de nos tornarmos uma nação atormentada pelo embate do “eu contra você” e do “nós contra eles”, precisamos fazer do debate civilizado entre os diferentes o instrumento para solução dos problemas e avanço da sociedade. “Já superamos o tempo das cavernas e hoje podemos adquirir conhecimento e resolver problemas de maneira integrada e civilizada. Agimos e pensamos diferente, mas somos todos brasileiros e compartilhamos a busca comum pela felicidade, dignidade e acesso aos direitos sociais previstos na Constituição, tais como: educação, saúde, trabalho e segurança. Em essência, buscamos todos o mesmo fim, sabemos aonde queremos chegar, o que muda é o pensamento individual sobre o melhor meio” - afirma o militar que, no seu surgimento dentro da chapa de Bolsonaro, em 2018, despertou o choque entre os que temiam e os que pregavam o golpe. Diferente dos que fazem estripulias em nome da democracia, ele a prega na sua essência, como na Grécia, o seu berço. Somos forçados a lembrar que a democracia, no Brasil, nunca foi artigo de primeira necessidade. Sempre serviu para sustentar o discurso político tanto da direita quanto da esquerda, mas foram raros os momentos de verdadeira prática. Houve até a contraditória frase do último presidente do regime militar, general João Batista Figueiredo, que num dos seus costumeiros gestos largos, prometeu “prender e arrebentar” quem o tentasse impedir de transformar o Brasil numa verdadeira democracia. Todos os que pregaram a ditadura do proletariado, inclusive os que recorreram à luta armada, ao longo de nossa controversa República, declaravam fazê-lo em defesa da democracia. Os militares de 1964 justificaram a quebra institucional como meio de manter o regime democrático contra o iminente golpe de esquerda... Divulgada como o regime em que o povo governa, a democracia brasileira não passou de um pano de fundo onde os grupos dominantes da política defenderam os próprios interesses que, na maioria das vezes, não eram os do povo. Desde o advento da República, em 1889, passando pela República Velha, das oligarquias, a Era Vergas, o período dito democrático 1945-64, os governos militares (1964-85) e a Nova ou Sexta República, a partir de 1985, todos se disseram democráticos, mas muitos, como os que participaram do Foro de São Paulo, sonharam criar a URSAL, uma estrutura ditatorial no moldes da extinta União Soviética, para governar a América Latina. E, quando Bolsonaro e Mourão partiram para resgatar o nacionalismo verde-e-amarelo (no lugar do vermelho), acusaram-nos de pretenderem o golpe à direita. O discurso foi tão forte que aquela pequena parcela que torce pela ruptura institucional chegou até a pensar que ela estava para acontecer. Hamilton Mourão tem razão. Em vez do debate bestial e improdutivo que só faz o povo desgostar e até odiar a classe política, é preciso encontrar a forma civilizada de convivência entre os diferentes e exercitar o diálogo para de suas contraposições resultarem as soluções aos problemas do país. Não podemos continuar ouvindo a pregação onde os pregadores classificam seus adversários como genocidas, charlatães, corruptos, desequilibrados, ladrões e outras designações negativas a quem exerce o poder, já o exerceu ou é candidato a ele. A classe política tem de se respeitar e definir claramente a diferença entre adversário e inimigo para poder com isso alcançar o debate racional e produtivo. Durante as 13 décadas de República, dita democrática, o brasileiro nunca experimentou a verdadeira democracia. Ela foi apenas bandeira para discursos. As lideranças precisam definir claramente o que seria a democracia brasileira e começar sua construção. Temos tudo para isso, inclusive as Forças Armadas avessas à intervenção, diferente do que ocorreu no passado. O artigo do general Mourão é um convite à grande tarefa de dar forma e consequência ao regime democrático, que só existe no papel. Os políticos precisam parar de falar mal do adversário, começar a falar bem do país e mostrar ao povo a importância da participação de cada um nessa grande obra... Nota do Editor: Dirceu Cardoso Gonçalves é tenente da Polícia Militar do Estado de São Paulo e dirigente da ASPOMIL (Associação de Assist. Social dos Policiais Militares de São Paulo).
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