Nunca apoiei político ou escolhi candidato em quem votar por ser de centro, de direita ou de esquerda. O rótulo, oriundo da época da Revolução Francesa (1789) não tem a menor contemporaneidade com a política de hoje, especialmente a brasileira. Difícil crer que onde há 35 partidos oficialmente reconhecidos e autorizados a funcionar e outros 70 à espera de registro, seja possível agregar as correntes dentro das três tendências básicas, das híbridas, como centro-esquerda e centro-direita, e até de outras possíveis composições de ocasião. Prefiro fazer a escola com base nas propostas e na confiabilidade transmitida pelos proponentes. Mas, com cem tendências soltas na praça, fica muito difícil e a maioria delas não decola. Chega-se a pensar que muitos indivíduos só montam ou aderem a partidos políticos com olhos grandes sobre as polpudas verbas públicas distribuídas às agremiações pelos fundos partidário e eleitoral. Faltando 11 meses para as eleições - de presidente, governador, senador e deputado - avista-se o presidente Jair Bolsonaro, na direita, movimentando-se para manter a hegemonia conquistada em 2018, que o elegeu; e o que restou do Partido dos Trabalhadores após o impeachment de Dilma Rousseff, tentando se viabilizar sob o rótulo de esquerda. Quem olhar cuidadosamente na direção das duas correntes, verificará que não se alinham às tendências que encarnam, de direita conservadora e nem de esquerda social e popular. Mas, também, a festejada democracia brasileira, sofre de indefinições e esquisitices que a levam a sofrer solavancos como os mais recentes de censura às redes sociais e comportamentos radicais de indivíduos e setores cuja obrigação institucional é dar aporte ao sistema democrático. Os que não conseguiram se alinhar com Bolsonaro e nem tiveram a coragem de se juntar ao PT e seus satélites, falam na construção de uma suposta "terceira via", que seria um candidato de centro ou, pelo menos, não de direita nem de esquerda. O difícil é sacar do universo político-partidário alguém com essas características e, ainda, portador do carisma e de estrutura para disputar com possibilidades de êxito a briga com as extremas polarizadas. Sérgio Moro foi citado, nos últimos dias, como sendo essa figura. Mas não há a definição segura se para presidente da República, governador, senador ou deputado (federal ou estadual). Essa opção talvez fosse mais acessível se, em vez de deixar a magistratura para se tornar ministro da Justiça, tivesse ele continuado à frente da sua 2ª Vara Federal de Curitiba, cuidando da Operação Lava Jato, à qual durante sua atuação, conferiu dignidade e com ela ajudou a reescrever a história do combate à corrupção no Brasil. Tivesse lá permanecido, dificilmente os adversários da operação - muitos deles por puro temor sobre o próprio destino - esvaziariam a "mãos limpas" brasileira e nem os defensores do réu Lula emplacariam tese de sua (para mim improvável) suspeição nos processos em que julgou o ex-presidente. Sem a proteção natural da toga e jejuno na convivência do dia a dia da política e do governo, o ex-juiz acreditou, por exemplo, que o ministério da Justiça lhe seria entregue "de porteira fechada" e ali poderia agir absoluto. Ao constatar que não era bem assim, optou por sair atirando. Disse - mas não conseguiu provar - que Boldonaro interferia na Policia Federal. Só porque, independente do que tenha tratado por ocasião da posse, o presidente insistia em nomear o novo diretor da instituição, atribuição que, pelo sabido, é prerrogativa sua. Mas as derrapadas na política não chegam a comprometer a carreira de julgador e nem diminuem a contribuição que deu ao país. Depois de suas sentenças contra ex-governantes, parlamentares, líderes políticos, megaempresários e corruptos incrustados no poder, a maioria delas confirmadas e até agravadas em segunda, e terceira instâncias e até no STF, ficou mais difícil a prática da corrupção e do assalto aos cofres públicos nacionais. Moro e Deltan Dalagnol, ex-coordenador força-tarefa da Lava Jato - que também se movimenta no sentido de trocar o Ministério Público pela política, precisam avaliar criteriosamente as suas possibilidades. Não dar ouvidos a quem não conhecem de fato e nem o passo maior que a perna, para evitar que, em vez da vitória, o prestígio de que desfrutam sirva apenas de calço e alavanca para eleger ou reeleger outros integrantes da cena politica que, por conta da polarização direita-esquerda, ficaram sem espaço e hoje precisam estar à sombra de quem, mesmo não tendo a certeza da eleição para os postos de alta relevância, possa puxar votos e ajudar na formação das bancadas de senador e de deputado federal e até estadual. O meio é frio, interesseiro, aproveitador e perverso. Quanto um político, por mais sério que pareça, incentiva alguém a altas empreitadas, costumeiramente não está preocupado com o futuro do incentivado, mas fazendo as contas de como isso pode contribuir na própria eleição, ou reeleição. Isso é clássico... Nota do Editor: Dirceu Cardoso Gonçalves é tenente da Polícia Militar do Estado de São Paulo e dirigente da ASPOMIL (Associação de Assist. Social dos Policiais Militares de São Paulo).
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