| Arquivo UbaWeb | | | | A implantação dos módulos de praia modificou a paisagem de isolamento que existia anteriormente. |
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Em 1986 a aparência da praia Grande era o que se vê nas fotos ao lado. Havia mais de cem barracas, trailers e carrinhos que ali permaneciam abandonados mesmo nas baixas das temporadas. A Prefeitura na época resolveu intervir em nome do respeito ao turista e à cidade. Numa criteriosa análise legal dos documentos apresentados pelos então ambulantes que não ambulavam, todos o que restaram com direito foram classificados por ordem de antigüidade e nessa ordem, foram relocando os seus pontos, ou escolhendo um dos dezoito pontos de construção do módulo especial criado pela lei 840/86 para o comércio nas praias. A lei e o projeto final dos módulos foram discutidos com as parte interessadas: a PMU e a AVAU, associação da classe. Só para registro, o projeto final, conjugando atividade comercial e paisagismo, foi elaborado por Márcia Nerath, então titular da SAU. Comparado com a degradante paisagem desenhada pelas barracas abandonadas, os módulos especiais foram naquela época, um grande avanço. Na parte legal houve também um avanço. Os donos das barracas recebiam licenças de ambulantes, a lei de ambulantes os obrigava ao impossível, ambular com uma barraca, a nova lei deu-lhes a permissão de uso do espaço público com um equipamento adequado e uniformizado. Os governos que se sucederam não respeitaram aqueles princípios e foram inventando direitos no avilte da Constituição Federal. Não existe venda legal de permissão. Autorizou-se. O número inicial de módulos, estipulado com o objetivo de oferecer o serviço ao turista sem roubar o espaço do cidadão, foi ampliado sem critérios. A uniformidade das construções como indicador da propriedade pública, foi deturpada quando se aceitou alterações e ampliações ao bel prazer e disposição financeira dos permissionários. Restam poucos permissionários daqueles primeiros tempos da lei 840/86, todos os outros são efeitos colaterais da omissão dos governos que se sucederam. A população sempre esteve indignada com os abusos cometidos na praia Grande, aumentou ao ponto da revolta, quando das declarações de alguns quiosqueiros que se apresentaram como proprietários, culminando assim, com o desdém que alguns permissionários sempre demonstraram com o espaço público que ocupam. Não sou advogado, cito as leis como simples exercício de memória e na busca de um alento diante do absurdo que a omissão desenhou na praia Grande e que se espalhou pela cidade. Do mesmo jeito, não sou médico, e raras vezes paciente graças à minha boa saúde, mesmo assim, vi muitas vezes o efeito nocivo de um remédio aplicado de maneira errada. Sei também que o mais prudente é a suspensão do remédio para se cortar de imediato os efeitos colaterais, evitando que eles se tornem maiores que a doença inicialmente atacada. Nunca houve uma atitude decisiva sobre a questão, e o efeito colateral da praia Grande se espalhou por todas as praias e pelas ruas da cidade, notadamente pelos carrinhos de lanche assemelhados a trailers, espalhando mesas e cadeiras pelas calçadas. Ou ainda, pela depressiva e depreciativa feirinha de artesanato (?) na avenida. Primeiro, ao modo da lei 840/86, devemos resolver a situação de todos que compraram as permissões sem amparo legal, ou seja, por fim nos efeitos colaterais, para depois avaliar o novo remédio que deveremos usar, é para isso que serve o apelo à Justiça. Se alguém vai usar isso de forma eleitoreira, veremos em 2008. Até lá, em pleno 2005, temos a obrigação de cortar o mal pela raiz, pondo fim ao câncer surgido na esperteza de uns ou na omissão de outros. Tudo em nome da nossa corroída cidadania.
Nota do Editor: Carlos Augusto Rizzo mora em Ubatuba desde 1980, sendo marceneiro e escritor. Como escritor, publicou "Vocabulário Tupi-guarani", "O Falar Caiçara" em parceria com João Barreto e "Checklist to Birdwatching". Montou uma pequena editora que vem publicando suas obras e as de outros autores.
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