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Opinião
11/11/2018 - 06h52
Estabilização da jurisprudência
Luiz Fernando Valladão Nogueira
 

Fala-se que, no Japão, marcado por cultura resistente à litigiosidade, as carreiras jurídicas deixaram de ser promissoras. As pessoas lá tendem a resolver seus próprios conflitos, sem a intervenção do Judiciário, diminuindo-se, assim, o número de processos judiciais. Diferente disso, o Brasil ainda está sob a vigência do período pós-Constituição/1988, a qual, no ritmo da redemocratização, abriu o Judiciário e estimulou as demandas.

Todavia, passadas algumas décadas de tantos conflitos judiciais no Judiciário brasileiro, percebeu-se um estrangulamento desse Poder, o que trouxe desalento aos jurisdicionados, sobretudo advindo da morosidade e dos tratamentos díspares. Assim é que, sem mecanismos eficientes para pacificar os entendimentos judiciais, o Judiciário passou a deixar de trazer segurança jurídica. E, como os interessados não tinham certeza sobre estarem com razão ou não, optavam sempre pelo ajuizamento de determinada ação. Com um pouco de sorte, pensava-se, o processo poderia ser julgado por órgão julgador detentor de entendimento favorável ao postulante. Como consequência dessa obsessão pelo litígio, o Judiciário, repita-se, ficou abarrotado de processos e, naturalmente, passou a produzir decisões demoradas.

Com a recente entrada em vigor do Código de Processo Civil (Lei 13.105/2015), o legislador propôs novas diretrizes, valendo destacar, dentre elas, a que impõe a estabilização da jurisprudência. Com efeito, agora, o magistrado, seja de qual instância for, tem a obrigação de explicar a razão pela qual está decidindo diferentemente de determinado precedente invocado pela parte. Sem meias palavras, o art. 489, § 1º, inc. VI, do CPC, diz que não será fundamentada a decisão que “deixar de seguir enunciado de súmula, jurisprudência ou precedente invocado pela parte, sem demonstrar a existência de distinção no caso em julgamento ou a superação de entendimento”. Mais que isso, se alguma decisão deixar de aplicar os chamados precedentes vinculativos, a parte prejudicada poderá entrar, nos termos do art. 988 CPC, com a reclamação ao tribunal que pacificou o tema e requerer liminar para que haja a compulsória adaptação ao que foi pacificado.

Assim, por exemplo, quando houver julgamento pacificador sobre cláusulas de contratos bancários, o tema, da forma como pacificado, terá que, sempre, ser decidido em outros processos. Só assim, aquela impressão negativa de desigualdade nos julgamentos de causas iguais ficará superada. E, como consequência maior, ter-se-á diminuição de processos judiciais, pois os cidadãos perceberão que não se justifica ir ao Judiciário, já que este estará honrando suas decisões anteriores e trazendo segurança jurídica.

Insista-se: a paz social, que a todos interessa num mundo civilizado, estará sendo enaltecida na medida em que, convictos de que o Judiciário é estável e coerente, os cidadãos preferirão evitar desgastantes litígios. Sim, se o tema objeto de determinado conflito já foi pacificado nos tribunais, os cidadãos simplesmente deverão adaptar suas condutas a essa normatização, sendo infrutífero insistir com o Judiciário. Destaque-se, para evitar que se fale em estagnação, que o próprio CPC prevê a alteração da jurisprudência dominante – art. 927 §s 2º a 4º, o que se justifica, obviamente, pela própria velocidade dos fatos sociais, econômicos e políticos, não bastasse o inquietante subjetivismo do Direito. Mas, para que tal alteração aconteça, o Judiciário deverá ficar atento, sempre, à igualdade, proteção da confiança e segurança jurídica.

É necessário que haja uma mudança de cultura de todos nós, advogados, magistrados, promotores de justiça e, em especial, os próprios jurisdicionados. O advogado deve estimular seu cliente a conciliar e evitar conflitos ao redor dos quais o tema está pacificado; o magistrado deve se mostrar coerente em suas decisões e trazer segurança jurídica; o promotor de justiça deve estimular os meios de composição extrajudicial; e o cidadão-jurisdicionado há de ser mais justo e competente, ao ponto de resolver seus conflitos com terceiros, sem a intervenção do Estado-Juiz, e sim através do diálogo.

Nessa lógica, os Tribunais Superiores, Superior Tribunal de Justiça e Supremo Tribunal Federal, devem dar o exemplo, de maneira a coibirem as impulsivas decisões monocráticas de seus membros, muitas vezes totalmente distintas do entendimento do colegiado. E, mais ainda, devem usar cada vez mais, após detida reflexão e intenso debate, dos mecanismos que geram precedentes vinculativos. Enfim, a nossa cultura é bem diferente da Japonesa, mas podemos nos inspirar em alguns critérios que levam aquele povo a viver tanto tempo e com menos conflitos.


Nota do Editor: Luiz Fernando Valladão Nogueira – advogado, professor universitário, procurador do Município de BH, autor dos livros “Recursos e Procedimentos nos Tribunais” (4ª ed, ed. D´Placido) e “Recurso Especial no novo CPC” (4ª ed, Ed. Del Rey).

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