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Crônicas
21/05/2018 - 07h11
Ele contra o Universo
Henrique Fendrich
 

E naquela noite ele sentiu que talvez um plano sobrenatural estivesse para lhe alcançar. Havia muita coincidência naquela história, no fato de estarem os dois ali, conversando, para que ele achasse que tudo se deu por obra do acaso. Provavelmente, tudo havia sido planejado por alguém ou alguma força superior, em seus mínimos detalhes. Agora até alguns pedaços confusos da sua trajetória de vida ganhavam novo significado: tudo que havia acontecido com ele tinha o único propósito de conduzi-lo até esse instante, até o instante decisivo em que se encontrava. Então ele parou de se rebelar contra o Universo e teve certeza que, naquela noite, o seu destino estaria resolvido.

Parecia mentira que ela estivesse sentada ali. A primeira vez que a viu havia sido há quase dez anos. Desde o início ela chamou a sua atenção, sobretudo porque havia alguma coisa nela que o lembrava da sua paixão anterior. Ele era jovem e não suportava a ideia de ficar sem amor nenhum, então logo passou a amá-la em segredo. Viam-se todas as semanas, mas em meio a muitas pessoas, de tal forma que nunca chegaram sequer a precisar trocar palavras entre si. Minto, falaram-se uma vez, mas muito rapidamente. Falaram-se justamente no dia em que ele havia feito uma aposta com o Universo: se eles se falassem, o mínimo que fosse, aquela seria a mulher da sua vida. Ele ainda se lembrava bem dessa aposta, e não podia deixar de rir de prazer ao se dar conta de que, por caminhos tortuosos, tinha o Universo cumprido a sua parte e, depois de muitos anos de preparação, fizera com que ela estivesse ali, sentada bem ao seu lado, para que juntos cumprissem os seus destinos.

Falavam desse tempo. Ela pouco se lembrava, não lembrava muito bem dele, não lembrava muito bem nem de si mesma naquela época. E ele lhe dizia como ela era e como agia naquela época, cuidando para não passar a impressão (aliás, verdadeira) que a observava mais do que qualquer outra coisa. Contou também que a havia visto depois disso, perto de sua casa. Na verdade, ele a viu várias vezes em diferentes pontos da cidade, sempre inesperadamente, o que só podia atribuir a uma influência cósmica. Ela contou que estudava perto da sua casa. Contou ainda onde morava, e ele achou que as forças que regem a vida eram sem dúvida muito bem humoradas, pois era a mesma rua em que morava a sua paixão anterior. As coincidências eram sinais que ele não podia ignorar.

Mas o fato é que, apesar dessa visão um tanto mística, os dois realmente tinham muitos interesses em comum e uma visão de mundo parecida. Ela até lamentou que não tivessem se falado melhor antes, naquela época em que se viam. Sim, pois ela gostou dele, ela viu que ele a entendia, que podia falar com ele coisas que não falava com mais ninguém. Aquela foi uma noite muito alegre, de duas almas que se maravilham ao se descobrirem não muito diferentes.

Continuaram a conversa pelo celular, nos dias que se seguiram. Em verdade, passavam madrugadas inteiras conversando. Ele precisava acordar cedo de manhã, mas pouco se importava. Afinal, descobrira, quando já não esperava, que não era uma vida de solidão o que os deuses lhe haviam lhe destinado.

Foram duas semanas intensas. As conversas se estendiam, e com elas apareceram os primeiros defeitos. Passaram em revista certos pontos polêmicos, e ele teve a sensação de que ela não tinha o mesmo entusiasmo de antes. As madrugadas, sentia, haviam se tornado apenas uma obrigação para ela. Deixou então que ela tivesse a responsabilidade de puxar assunto, até o dia em que ela já não puxou nenhum.

Uma banana para você, Universo.

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