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Foi assim que os americanos do norte classificaram a importância do fato. Para a Ornitologia o reaparecimento de uma ave dada como extinta durante 50 anos se compararia, em extraordinário, a um retorno do rei do rock. O Campephilus principalii, ou Ivory woodpecker, ou ainda o pica-pau do bico de marfim, foi novamente observado. O ultimo registro dele era um filme em preto e branco rodado em 1950. Agora, todos os cientistas deverão registrá-lo com todas as cores, matizes e sons que as novas tecnologias nos oferecem. O interessante é que parte deste crédito devemos às entidades de caça. A legislação estadunidense reconhece o esporte da caça, mas para cada hectare liberado para a atividade, as entidades são obrigadas a recuperar outro tanto em ambiente degradado. Uma formula simples, que aplicada há mais de 50 anos, resulta em déficit de áreas a serem recuperadas. Nos Estados Unidos, as entidades ligadas à caça colocam os ambientalistas de carteirinha no chinelo. No Brasil andamos na contra mão. Caçar é roubo de propriedade pública, a legislação pune severamente o caçador preso em atividade, mas pune brandamente se o caçador matar o policial que o ameaça com detenção. Resultado: no meio do mato o caçador surpreendido pela polícia não tem dúvidas sobre o que deve fazer para não ser preso. O Policial Ambiental na segurança da cidade com sua vida sem valer nada no meio do mato, não tem dúvidas sobre como fazer para continuar vivo. Entre estas certezas as nossas espécies estão sumindo. Em Ubatuba onde temos 80% do território incluído em área de preservação a mata é o paraíso dos caçadores e dos degradadores de plantão. Não bastasse o desamparo legal aos policiais, muitos dos ambientalistas assalariados ainda estão voltando a pé de Woodstock. Ainda não descobriram que a morte das espécies pela caça, pela degradação ambiental ou pela omissão, é a mesma coisa. Outros ainda têm a cara-de-pau de se intitular proprietários de áreas de preservação ambiental, mas não tem o mínimo pudor quando o verdinho dos dólares aparece na frente. A Fazenda Angelim no bairro do Taquaral é o pior exemplo. Diz-se área de preservação, tem site na Internet, mas, há dois anos atrás alugou seu pedaço para a locação do filme "Flying vírus" Uma aventura neurótica norte-americana (seria pleonasmo?) combatendo um vírus mundialmente mortal com tiros e explosões no meio da Mata Atlântica. Em pleno abril de 2005 alugaram novamente para um evento tecno-musical movido a muitos decibéis e muitos outros que tais. Foi êxtase puro para os aficionados do melodioso putz-putz da musica eletrônica e um inferno, por 24 horas ininterruptas, para os moradores do bairro do Taquaral. A fazenda Angelim é um dos redutos de um pássaro endêmico em Ubatuba e em vias de extinção segundo a Bird Life international, o Ibama e o nosso Comitê das Bacias Hidrográficas no seu relatório 46.172 pág. 5-13. Depois do filme "Flying vírus" este pássaro reapareceu somente no ano passado, em setembro. Depois do êxtase tecno-musical não temos como precisar o que acontecerá. Enquanto isso os nossos assalariados ambientalistas estão discutindo entre si, não sabem como proteger um patrimônio mundial em uma propriedade particular. Se nos Estados Unidos eles estão festejando a volta do Ivory woodpecker e continuam acreditando que Elvis vai voltar. Em Ubatuba estamos enterrando espécies que nem conhecemos ao som tecno-musical do putz-putz, sob tilintar das moedas enchendo os bolsos de poucos, corroendo e destruindo o patrimônio de todos.
Nota do Editor: Carlos Augusto Rizzo mora em Ubatuba desde 1980, sendo marceneiro e escritor. Como escritor, publicou "Vocabulário Tupi-guarani", "O Falar Caiçara" em parceria com João Barreto e "Checklist to Birdwatching". Montou uma pequena editora que vem publicando suas obras e as de outros autores.
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