Tomie Ohtake morre [em São Paulo (SP), no dia 12/02/2015] aos 101 anos, essa foi a primeira manchete que vi quando soube do fato. O que já seria uma notícia que nos chamaria a atenção, dada a extensão de sua vida, o que venhamos, não é tão comum assim: viver um século. Contudo, o que é um século para quem já escreveu seu nome na matéria e inscreveu sua essência na tinta? Tomie Ohtake, a mulher morreu, porém sua obra resistirá ao tempo. Poderia dizer que a artista seguia uma tendência abstracionista, ou seja, sua obra não buscava contar, propriamente, uma história, mas atingir a nossa percepção, fazer com que um tipo de conhecimento, aquele que emana dos sentidos, aflorasse em nossa consciência, e permanecesse mais como sensação, do que conteúdo, do que as palavras. Dessa forma, partes dessa essência, da artista, e da obra, estão espalhadas pela cidade, pois além das pinturas abstratas feitas nas telas, suas pinceladas se condensaram, deixaram a superfície plana, e se projetaram pelas ruas. Caso queiram conhecê-las, ou se já conheciam a obra, mas não ligaram à artista, deixo duas dicas. A primeira, coincidindo como a idade com que ela viajou para o Brasil, para visitar um irmão, e acabou ficando por causa da guerra, 23, esse é um endereço de uma de suas esculturas: 23 de maio. O monumento à Imigração Japonesa, fato que ela viveu e traduziu em ondas, como a sensação do mar, a essência do mar, a percepção da vida. A segunda, enquanto viaja pelo metrô, talvez preocupado com a hora e com os atrasos, guarde uns instantes para observar ao seu lado, pela janela, as cores que ondulam, novamente como mar, o mar que separou a jovem Tomie, de sua terra natal, e lhe presenteou com outra vida. Observe no metrô Consolação, além do relógio, os painéis que se apresentam num jogo de cores – quentes frias, suaves e intensas – representando as estações do ano: a obra Quatro Estações. Enfim, o tempo, a essência, mais do que tinta, mais do que as esculturas, essa é a matéria com que Tomie Ohtake criou as suas obras. Espero, sinceramente, tenho esperança que vocês possam conhecer, ou melhor, sentir, e se deixar levar pela arte dessa nossa grande artista. Nota do Editor: Patrício Dugnani é professor de Comunicação e Artes da Universidade Presbiteriana Mackenzie.
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