A expectativa dos consumidores de imóveis em relação à qualidade de uma edificação ou de um apartamento ou casa sempre estão associadas a uma questão temporal, expressa pela vida útil. Afinal, de que adianta adquirir um imóvel que tenha qualidade no momento da entrega, mas que, em pouco tempo, apresente diversos defeitos? Ou ainda, que exija gastos em manutenção muito acima dos previstos após poucos anos de uso? Este tema foi objeto de um artigo publicado em 2012 e que agora merece uma nova reflexão em função do atual momento de mercado imobiliário brasileiro. Embora não seja comum no Brasil, muitas obras nos países desenvolvidos, especialmente as de grande porte, são contratadas e concebidas para atender a uma longa vida útil estabelecida pelo cliente e que passam a orientar todo o trabalho de elaboração dos projetos e de execução das obras. O aeroporto de Barajas, na Espanha, e a Ponte Vasco da Gama, em Portugal, são exemplos, dentre muitos, de obras que foram contratadas para ter uma vida útil superior a cem anos! Nestes países, também são utilizadas tecnologias para edificações que privilegiam uma durabilidade maior (de 30 a 70 anos normalmente) em função de referenciais consagrados pela sociedade que impõem esta prática. E a razão para que o contratante ou o sistema regulatório de um país exija uma vida útil mínima é simples: é mais barato investir mais recursos na construção e aumentar a vida útil do empreendimento (utilizando sistemas, materiais e tecnologias que tenham maior durabilidade), do que economizar na construção e depois dispender muito mais recursos na operação e manutenção para atingir a mesma vida útil. E como estamos cuidando da vida útil das construções brasileiras? Em julho de 2013, foi publicada a norma NBR 15575, elaborada no âmbito da ABNT (Associação Brasileira de Normas Técnicas), e conhecida como Norma de Desempenho de Edifícios. Este documento técnico estabeleceu níveis de desempenho mínimos para as edificações residenciais brasileiras em diversos quesitos relacionados às necessidades humanas (desempenho acústico, térmico, lumínico, segurança estrutural etc.) e sempre ao longo de uma vida útil mínima obrigatória. É o primeiro instrumento criado no Brasil que obriga os incorporadores e construtores e toda a cadeia da construção a conceberem e executarem empreendimentos que tenham padrões de qualidade obrigatórios e o potencial de atingir uma vida útil mínima definida em projeto. A publicação da norma foi bastante divulgada pela mídia e percebida por todo o setor como um importante marco regulatório e um divisor de águas na construção civil. A obtenção da vida útil é uma tarefa complexa e significa um novo modelo mental de projeto e concepção de empreendimentos que envolve toda a cadeia produtiva da construção. A criação de um banco de dados público com desempenho e durabilidade de materiais e sistemas construtivos, a capacitação de projetistas e profissionais para conceber produtos para o desempenho, a utilização do BIM (Building Information Modeling) para modelar e simular desempenho, a realização de ensaios de envelhecimento precoce, entre outras são algumas das ações que estão sendo realizadas por empresas, setores do governo e entidades de classe neste momento para viabilizar o atendimento integral da norma. O Secovi-SP, em conjunto com a Universidade de São Paulo, vai sediar de 3 a 5 de setembro, em São Paulo, o evento DBMC (Durability in Building, Materials and Components), que reúne os maiores especialistas mundiais em vida útil e durabilidade de construções, com o objetivo de contribuir para este processo de aprendizado tão importante para o país. A chamada do evento ilustra bem a importância do tema: "Qualquer estimativa de perdas econômicas resultantes de falhas na durabilidade das edificações leva inevitavelmente a valores tão astronomicamente altos que normalmente são encaradas com incredulidade". Além dos aspectos econômicos, a vida útil maior é essencial para a construção sustentável, pois quanto mais tempo dura um imóvel, mais tempo se leva para se retirar materiais da natureza. A informação clara sobre a vida útil também será um poderoso instrumento para o consumidor de imóvel aferir a qualidade do imóvel que vai adquirir. Construir não significa terminar algo, mas, sim, iniciá-lo. Nota do Editor: Carlos Alberto de Moraes Borges é vice-presidente de Tecnologia e Qualidade do Secovi-SP.
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