A senhora Xuxa, que exibe nos cabelos as eficientes reações da química, deve ser uma pessoa extremamente prendada e dona de uma sabedoria que dispensa técnicos em educação, pedagogos e outros cientistas da área, quando o tema é infância e juventude. Por causa da sábia madame, o pastor evangélico e deputado Eurico, foi defenestrado da Comissão de Constituição e Justiça da Câmara, sob a acusação de ter sido “intolerante e desrespeitoso”. Ele havia classificado como “um desrespeito às famílias do Brasil”, a presença teatral de Xuxa na Câmara para dar pareceres sobre a “lei da palmada”. E, para justificar sua intervenção, o parlamentar avivara a memória dos circunstantes com a lembrança do filme em que uma personagem, encarnada pela excelentíssima senhora, seduzia um menino de doze anos. Não sei se foi para resgatar a honorabilidade de Sua Senhoria dona Xuxa, ou porque ela represente um paradigma de moral sexual, ou porque sua sabedoria seja capaz de consertar os desarranjos do universo que o Palácio do Planalto a recebeu. Ao lado da presidente deste impoluto país, lá estava ela, abrilhantando com seus cabelos dourados a sanção da lei que declara crime hediondo “a exploração sexual de crianças e adolescentes”. O jornal Folha de São Paulo saiu a campo para conferir os efeitos da nova lei e estampou coisas estarrecedoras em suas páginas. E foi de lá do norte e do nordeste que provieram as histórias mais degradantes. Foi de lá, dos cemitérios de seringais, dos manguezais, do sertão pelado de calor e miséria, da terra onde apodreceu o que sobrou do umbigo do “doutor” Lula da Silva, que surgiu a matéria veiculada no jornal. Em Manaus, onde foi erguida a “Arena Amazonas”, ao custo de mais de 600 milhões de reais e três mortes por acidente de trabalho, menina frágil, com feições e corpo de criança, espera “faturar mais dinheiro” na Copa. Outra, conta com turistas endinheirados, americanos, ingleses. Em Recife, menino que se prostitui desde os 13 anos, espera “maricóns e gringas finas”. Tanto nas praias de Fortaleza como no interior do Ceará, adolescentes, desfilando com minissaias e shortinhos apertados, mostrando a barriga, não escondem a esperança de se darem bem com o aluguel do corpo durante o evento da FIFA. Entrementes, os Estados Unidos, sem a menor consideração para com o “pibinho” do Mantega, advertiam zelosamente seus cidadãos e o mundo de que no Brasil nem as “camisinhas” são confiáveis. E, isso posto, concitava-os (que futebol, que nada) a resguardarem seus desejos sexuais usando os resistentes preservativos norte-americanos. Sem educação, sem medidas concretas para a erradicação da miséria que empurra meninos e meninas para o mercado do sexo, não há como melhorar a imagem do Brasil. Sua má fama, construída em 1500, quando invasores portugueses, em jejum de mulher por mais de quarenta dias, deram de cara com índias nuas, é hoje alimentada pelos comerciais de bumbuns. Alguém precisa dizer aos políticos que tal fama, assim arraigada, não se destrói com leis, nem com os cabelos loiros da Xuxa. Nota do Editor: João Eichbaum é advogado e autor do livro Esse Circo Chamado Justiça.
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