A decisão draconiana da prefeitura de São Paulo, liderada pelo PSDB, de obrigar seus credores a assinarem acordo para receberem o que lhes é devido, dentro de condições absolutamente insustentáveis, foi a gota d’água num processo extremamente desgastante para as relações entre o poder público e a iniciativa privada. Torna-se fundamental a atenção de todos para que o mau exemplo da Capital não venha a ser seguido por outros municípios. Desde agosto do ano passado, a administração anterior da prefeitura paulistana, capitaneada pelo PT, começou a atrasar uma série de pagamentos. Posteriormente, cancelou empenhos, não pagando as obras contratadas, autorizadas, executadas e medidas. Deixou em caixa um saldo que, na avaliação da nova administração, é insuficiente para quitar as dívidas. Apesar dos reiterados apelos à atual administração, as entidades representativas dos credores não foram chamadas ao diálogo, após terem sido designadas, em audiência pública, pela própria prefeitura, como interlocutoras para negociar a forma de pagamento das dívidas. Tomaram conhecimento da decisão da prefeitura pela imprensa. É no mínimo estranhável que, depois de dez anos de vigência da Lei de Licitações e Contratos, corramos o risco de ver quebrada uma das normas ali colocada justamente para se evitar qualquer tipo de manipulação na relação do Estado com os seus fornecedores: a ordem cronológica dos pagamentos. Esse rompimento seria, no mínimo, um ato de improbidade administrativa. Também é bizarro que a Lei de Responsabilidade, tão cuidadosamente elaborada e aprovada na gestão de um presidente do PSDB, e que hoje continua sendo seguida até de forma exagerada pela gestão presidencial do PT, esteja sendo de tal forma ameaçada por líderes desses dois partidos no município de São Paulo, nos últimos meses. A confiança da iniciativa privada em parcerias com o poder público foi seriamente abalada a partir do momento em que a prefeitura condicionou o pagamento das dívidas à assinatura de acordos pelos quais quase mil credores terão seus pagamentos estendidos em prazos variados até 2012. Esta e outras condições, como a de condicionar os pagamentos devidos apenas aos contribuintes adimplentes com o fisco municipal (o que uma coisa tem a ver com a outra?), configuram indiscutível afronta aos contratos, atos jurídicos perfeitos. Da mesma forma, os contratos já vinham sido desrespeitados desde o fim da gestão anterior. Todos ainda se lembram como o compromisso com o respeito aos contratos foi cobrado do atual presidente da República, do PT, quando ainda candidato, e não de seu maior adversário, do PSDB - que aliás justamente é hoje o prefeito de São Paulo. O autoritarismo de que se reveste a imposição da forma de pagamento inclui a disposição de deixar uma parte destas dívidas para a administração municipal seguinte, o que representa uma clara ameaça ao espírito da Lei de Responsabilidade Fiscal. Se essa hipótese aventada pela Prefeitura se configurar, a atual gestão municipal irá reproduzir exatamente a ilegalidade que administrações anteriores cometeram. O argumento de que a prefeitura teria que suspender todos os seus atuais compromissos se fosse honrar as dívidas para com seus credores não se sustenta. Com base na experiência em situações anteriores, as entidades que representam aquelas empresas têm várias propostas para que São Paulo possa trocar o pneu furado com o carro andando. Para tanto, é necessário que a administração se disponha a negociar sem colocar nenhuma espada sobre a cabeça de quem quer que seja. É preciso buscar, de comum acordo, encontrar as condições em que as dívidas serão pagas, de modo a respeitar a ordem jurídica, a legislação e o equilíbrio econômico-financeiro dos contratos. Num momento em que a expansão da infra-estrutura e do acesso dos brasileiros ao exercício de seus direitos básicos dependerá cada vez mais das parcerias público-privadas, é preciso que a prefeitura volte atrás e aceite negociar, para que, sobretudo, o clima de confiança mútua seja restabelecido. Nota do Editor: João Claudio Robusti é presidente do SindusCon-SP (Sindicato da Indústria da Construção Civil do Estado de São Paulo).
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