Condições de vida e de saúde mudaram desde a criação do Estatuto do Idoso, que completa 10 anos em outubro
“A definição de população idosa ficou velha?” Quem levanta a questão é a demógrafa Ana Amélia Camarano, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada – Ipea (www.ipea.gov.br). Ela propõe redefinir o conceito na Lei no 10.741/2003, o Estatuto do Idoso, que completa 10 anos em outubro e, há uma década, estipulou como população idosa, para diversos fins, quem tem 60 anos de idade ou mais. A proposta de Ana Amélia é aumentar a linha definidora para 65 anos. “Referendando o que já fora estabelecido pela Política Nacional do Idoso de 1994, o Estatuto define como idosa a população de 60 anos ou mais, o que ratifica o patamar estabelecido pelas Nações Unidas em 1982. Em 1994, a esperança de vida ao nascer da população brasileira foi estimada em 68,1 anos. Entre 1994 e 2011, este indicador aumentou 6,0 anos e, entre 2003 e 2011, 2,8 anos, alcançando 74,1. Isso tem sido acompanhado por uma melhoria das condições de saúde física, cognitiva e mental da população idosa, bem como de sua participação social. Em 2011, 57,2% dos homens de 60 a 64 anos participava das atividades econômicas”, destaca a pesquisadora. No Texto para Discussão n° 1840, Estatuto do Idoso: avanços com contradições, Ana Amélia sugere mudanças na norma, algumas já em debate no Legislativo. O estudo ressalta que o maior avanço do Estatuto do Idoso está no estabelecimento de crimes e sanções administrativas para o não cumprimento dos ditames legais, atribuindo ao Ministério Público a responsabilidade de agir para garanti-los. A principal lacuna, por outro lado, é a indefinição de prioridades para sua implementação e de fontes para o seu financiamento, implicando uma divisão mal planejada dos custos entre a sociedade, o que, segundo a pesquisadora, pode ameaçar a solidariedade intergeracional. Meia-entrada O Estatuto assegura desconto de 50% em atividades culturais e de lazer, gratuidade em transportes coletivos e vaga especial em transportes e estacionamentos públicos. “O mérito destes dispositivos para promover a integração e participação social da população idosa é indiscutível. No entanto, há que se reconhecer os grandes avanços da Constituição Federal de 1988 na ampliação da cobertura dos benefícios da seguridade social, o que resultou em uma dissociação entre envelhecimento e pobreza. Com isto, não se pode mais dizer que a população idosa é mais pobre do que a dos demais grupos etários”, avalia Ana Amélia. A pesquisadora sugere que estes benefícios sejam concedidos por necessidade em vez de idade e apoia a proposta em tramitação na Câmara dos Deputados para fixar uma cota de 40% para meias-entradas, para que os produtores possam dimensionar melhor as receitas a serem obtidas e estabelecer o valor da entrada. Transportes públicos e estacionamentos Quanto às vagas reservadas, considera as medidas importantes para os indivíduos com dificuldades de locomoção, mas pondera que, para os demais idosos, esses direitos podem constituir-se em “privilégios”. Planos de saúde Com a proibição de preços diferenciados para idosos nos planos de saúde, os aumentos dos custos decorrentes do envelhecimento dos segurados passaram a ser compartilhados com os demais participantes. As mensalidades aumentam em torno de 20% por ano de idade até os 58 anos. Como não podem ser aumentadas a partir dos 60 anos, saltam 70% para quem completa 59 anos. Além disso, a Agência Nacional de Saúde (ANS) impede que o valor fixado para a última faixa etária supere em mais de seis vezes o valor da primeira, o que força a distribuição dos custos entre todas, dificultando a cobertura nas faixas iniciais. Cuidadoras O texto aponta contradição na responsabilização da família, sem ajuda do Estado, pelo cuidado do idoso dependente. “Dados os valores culturais, o cuidado recai sobre a mulher. Ou seja, desresponsabiliza o Estado da função de cuidar, mas lhe atribui a responsabilidade de fiscalizar e punir. Isto significa desconsiderar as mudanças na família, no papel social da mulher e no envelhecimento da própria população idosa”, afirma a autora, que sugere políticas de cuidado ao idoso dependente tanto no domicílio quanto no hospital. “Não se pode perder de vista o principal amálgama social – a solidariedade – em nenhuma de suas modalidades – intergeracional, familiar e social ao pensar mecanismos viáveis para a promoção do bem-estar social”, conclui o estudo.
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