O fim dos 14º e 15º salários dos deputados e senadores é certo, pelo mérito e também por não se sustentar perante a opinião pública. Resta saber quando isso acontecerá. Desde março, a mídia nacional emplacou uma louvável campanha pela extinção desse benefício, estimulando a pressão popular para levar o Legislativo a adotar esta inadiável decisão. O Senado rapidamente se decidiu, mas, na Câmara a proposta de extinção tem ainda enfrentado percalços protelatórios. O pagamento do benefício a deputados e senadores foi instituído pela Constituição de 1946 para cobrir os altos gastos que os parlamentares tinham com o deslocamento das famílias dos parlamentares para o Rio de Janeiro, capital federal na época. Os salários extras permaneceram no texto constitucional de 1967, vigorando durante a maior parte do período da ditadura militar, iniciada em 1964. A Constituição de 1988 eliminou qualquer menção ao chamado “auxílio-paletó”. Ele voltou a existir por meio de dois decretos legislativos de 1995 e 2006. Essa despesa representa cerca de R$ 34,6 milhões para o Senado em oito anos de mandato e cerca de R$ 109,6 milhões para a Câmara dos Deputados em quatro anos de mandato. Estes gastos passavam despercebidos até que a mídia denunciou, em março, que não era pago o imposto de renda devido sobre os salários extras dos senadores. O pagamento do 14° e do 15° salários foi “justificado", novamente, como forma de compensar despesas com transporte, entre outros gastos “imprescindíveis ao comparecimento à sessão legislativa”. Entretanto, os parlamentares recebem ressarcimento pelo gasto com viagens, assim como por despesas com alimentação. Para além do recolhimento de impostos pelo Senado, o tema entrou na agenda de parcela importante da opinião pública e da sociedade civil, assim como do Parlamento. Este quadro influenciou a decisão tomada em diversas Assembleias Legislativas pelo país e mobilizou artistas em um movimento intitulado #AbaixoAMordomia. Em resposta a essa situação constrangedora que veio se formando, o Senado aprovou Projeto apresentado pela senadora Gleisi Hoffmann, atual ministra da Casa Civil. Com isto, enviou à Câmara o Projeto de Decreto Legislativo (PDC 569/12), que estabelece que a ajuda de custo seja paga aos membros do Congresso Nacional somente no início e no final do mandato parlamentar. Assim, o pagamento deixa de ser anual passando a acontecer a cada mandato. Vale registrar que o Senado aprovou a proposta por unanimidade em menos de três meses e a encaminhou para apreciação na Câmara. É razoável supor que, no Senado, se considerou a evolução do tema no seio da opinião pública. Com a consolidação da experiência democrática e o crescimento do discernimento cidadão, o pagamento do 14° e do 15° salários não tinha mais justificativa. O raciocínio é simples: o trabalhador e a trabalhadora não recebem 14º e 15º salários; recebem apenas o 13°, o descanso remunerado. Por que os congressistas deveriam recebê-los? O PDC 569/12 começou a tramitar na Câmara na Comissão de Finanças e Tributação, em que fui designado relator do projeto e, de pronto, emiti parecer favorável à extinção do 14º e 15º salários. Depois disso, começou a campanha eleitoral que dominou a cena política do país. A tramitação de proposições perdeu celeridade, salvo projetos e Medidas Provisórias de enorme apelo. Os momentos de “esforço concentrado” não foram capazes de mobilizar o quórum mínimo para o funcionamento regular do Plenário e das Comissões permanentes e especiais. Solicitei tratamento prioritário para o projeto. Com isso, conseguimos colocá-lo na frente de 57 outros, que também tramitam na comissão, esperando aprovação. Nas últimas reuniões da CFT em que ele foi para a pauta, contamos com a colaboração do deputado Antonio Andrade (PMDB/MG), presidente da Comissão, que flexibilizou o tempo de espera para formação do quórum, estendendo-o para além dos 30 minutos regulamentares, e aceitou nosso requerimento de inversão de pauta. Entretanto, o quórum mínimo, de 17 deputados para instalar os trabalhos e apreciar o PDC 569/12 não foi alcançado. Algumas vezes, a sensação de frustração decorrente da lentidão do processo foi inevitável. Entretanto, com o término do processo eleitoral, é hora de renovarmos os esforços para a aprovação deste projeto, símbolo da aproximação do Parlamento do interesse, e direitos, dos cidadãos. Uma enquete realizada pelo Correio Braziliense mostrou que a maioria dos deputados é a favor do projeto. Assim, se o texto fosse submetido hoje ao plenário, o número de votos favoráveis, muito provavelmente, seria suficiente para derrubar o benefício, já que para sua aprovação seria necessária maioria simples, ou seja, 257 votos. Por tudo isso, acredito que o mais rapidamente possível, a Câmara extinguirá o 14° e o 15° salários dos deputados e senadores. Nota do Editor: Afonso Florence é deputado federal (PT-BA), relator do PDC 569/12 na Comissão de Finanças e Tributação da Câmara.
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