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Arquitetura e Engenharia
15/08/2012 - 18h02
Construções sustentáveis são inviáveis?
Hamilton de França Leite Júnior
 

Do ponto de vista de grande parte dos incorporadores imobiliários brasileiros, construções sustentáveis são inviáveis porque existe um importante obstáculo para que o resultado da equação econômica desse tipo de construção seja atrativa para eles.

No sistema de produção e comercialização de imóveis, regido pela Lei 4591/64, empreendimentos são concebidos e produzidos pelo incorporador, que vende as unidades na planta e, após a emissão do habite-se, faz a entrega aos proprietários finais, que as habitam ou locam a terceiros.

Edifícios certificados como sustentáveis têm esta característica atestada por uma terceira parte, que verifica o atendimento dos requisitos estabelecidos em suas normas. Esses produtos demandam investimentos adicionais entre 3% e 8%. Numa composição típica de viabilidade de um projeto residencial, executado em cidades de porte médio, a obra representa 55% do valor geral de vendas (VGV) e as demais despesas, 28% (terreno 5%, impostos 6,75%, financeiras 5%, marketing 3,5%, corretagem 3,25%, administração 2,5%, jurídicas 1% e projetos 1%), que perfaz uma margem de lucro de 17%. Se não houver aumento equivalente no VGV, um incremento de 4% no custo da obra reduz o resultado para um nível que pode ficar abaixo da atratividade mínima aceitável pelo acionista, por exemplo, de 15%.

São nas atividades sob responsabilidade do incorporador, principalmente na etapa de concepção, que empreendimentos podem se tornar plenamente sustentáveis, e é na fase de obras que ocorrem os dispêndios complementares.

De forma legítima, o empresário tem o objetivo de evitar quaisquer custos adicionais, a não ser que tragam retornos compatíveis. Porém, para ele, estes retornos não são suficientemente evidentes para que possa justificar a certificação de uma obra aos acionistas.

Do outro lado da equação, estão os beneficiários - os usuários, que desfrutam de melhor qualidade do ar interno, da iluminação, da ventilação, do conforto olfativo, térmico e acústico e menor toxicidade dos materiais utilizados. As empresas ocupantes desse tipo de imóvel reduzem a taxa de absenteísmo e obtêm maior produtividade de seus funcionários. O governo, por sua vez, reduz gastos com água, energia, saúde e locais para disposição de resíduos, além de reduções de emissões de gases de efeito estufa e poluentes.

Gregory Kats, em seu livro “Greening our Built World. Costs, Benefits and Strategies”, apresenta os custos e benefícios financeiros, a partir dos resultados provenientes de 170 green buildings, em grande maioria localizados nos EUA. No livro, que estará em breve disponível para download gratuito no site do Secovi-SP, o autor constatou que os benefícios financeiros (entre $49,90 e $66,30) trazidos à valor presente (em US$/pé2), nos 20 anos da vida dos edifícios estudados, referentes a economia de água ($0,5), energia ($5,8), manutenção e operação ($8,5), saúde e produtividade (entre $36,90 e $55,30) e redução de emissões ($1,20), superam em mais de dez vezes os custos extras (entre $3 e $5).

Ainda de acordo com a publicação de Kats, os valores de venda de escritórios certificados são, em média, 9% maiores do que seus equivalentes convencionais, considerando aspectos como idade, localização, tamanho e outros fatores que afetam as avaliações, além de um aumento de 9,9% do retorno sobre investimentos, 6,4% na taxa de ocupação e 6,1% no valor da locação. Compradores residenciais estão dispostos a pagar 5,8% a mais por moradias “verdes”. Já na esfera pública, uma economia de 11% em infraestrutura é esperada, quando os conceitos de uso e ocupação urbana sustentável também são agregados. Isto poderia representar mais de R$ 100 bilhões, se considerado o orçamento para o PAC 2 no período entre 2011 e 2014.

Portanto, se ampliarmos o foco das análises econômicas para o ciclo de vida completo do edifício, constataremos que a aplicação dos conceitos da construção sustentável faz todo sentido.

Como então resolver o grave conflito de interesses econômicos entre o agente que investe e os que são favorecidos, dentro do modelo predominante no Brasil? Abaixo, algumas possibilidades:

1) O empreendedor deve tomar conhecimento de todos os aspectos econômicos positivos relacionados à produção socioambiental responsável através das pesquisas nacionais e internacionais existentes. Porém, um volume muito maior de pesquisas precisa ser realizado, especialmente aquelas que considerem as características específicas de nosso país.

2) Cabe à esfera pública oferecer incentivos e isenções fiscais às empresas e proprietários de imóveis, para a adoção de boas práticas, bem como regulamentar a atividade por meio de medidas que sejam econômica e tecnicamente viáveis, com prazos coerentes para implantação e após amplo debate entre todas as partes interessadas. Assim foi feito na ABNT NBR 15575 - Norma de Desempenho de Edificações, que será obrigatória a partir de março de 2013, quando todos os projetos deverão especificar uma vida útil mínima para os principais sistemas que compõem uma edificação. Em função disso, os projetistas e os incorporadores terão de pensar no custo global do empreendimento durante todo seu ciclo de vida e não mais apenas no custo da construção.

3) Diversos materiais, sistemas, equipamentos e tecnologias, que não necessitam de desembolsos suplementares, podem ser utilizados para tornar os empreendimentos mais sustentáveis, mesmo que não seja possível certificá-los.

4) Informar o comprador acerca de todas as vantagens inerentes a um produto com tais características, para que ele os possa valorizar de forma justa.

O amplo emprego de qualquer desenvolvimento sustentável, por iniciativa das empresas, só ocorre quando somos capazes de transformar obstáculos econômicos em resultados positivos, pois estes são a principal força motriz para o avanço de qualquer organização com fins lucrativos.


Nota do Editor: Hamilton de França Leite Júnior é diretor do Secovi-SP, da FIABCI e da Casoi Desenvolvimento Imobiliário.

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