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COLUNISTA
Carlos Rizzo
10/01/2005 - 14h04
Café no meu pé
 
 

O arbusto da família das rubiáceas, originário da Arábia, nos fornece a drupa elipsóide ou globosa, vermelha, com escassa polpa adocicada e duas grandes sementes que secas e torradas adquirem cor marron-escura e constituem matéria prima para o preparo da bebida trazida pelos portugueses.

Sou um bebedor inveterado dessa infusão aromática, sei que o exagero não é nada saudável, mas não resisto a um cafezinho. Junta que todos os meus amigos sabem dessa minha preferência, e o resultado é uma dose diária exagerada.

O café adquiriu os mais diversos sabores nas mais diversas maneiras de se preparar e servir, mas continua café, não perde a classe mesmo gelado. Até no diminutivo, o "me dá um cafezinho" é muito mais para o carinhoso do que para o depreciativo. A associação do café com outras drogas, infelizmente é inevitável. Para os fumantes, ato contínuo ao cafezinho é o cigarro, o que resulta numa combinação de hábitos nada saudáveis.

O caiçara tem uma particularidade com o café, o café interume. Quando falado por quem oferece é igual a uma justificativa se desculpando por não haver nada para oferecer no acompanhamento. Mas quando falado por quem foi servido, é sempre uma critica por ser recebido com um café sem nada de acompanhamento.

Ubatuba é pródiga, e em tempos de eleições aparecem outros tipos de cafés. A associação de candidato, café e eleitor nem sempre é saudável também.

Tem a quantidade imensa de cafezinhos que os candidatos são obrigados a tomar na peregrinação pelos votos, conhecidos como café de campanha. Em caso de vitória o candidato tem quatro anos para curar a ulcera estomacal adquirida; no caso de derrota a ulcera do candidato é a mesma, mas o café fica perdido por aí espalhando suas ulceras cerebrais.

Tem o café que o eleitor usa oferecer a todos os candidatos. Um cafedório esquecido no fogão, maldosamente requentado e servido só para ver a falsidade dos candidatos dizendo para a dona da casa: "Êta! Cafezinho bão!" E a dona da casa pensando consigo: "Êta! Candidato mintiroso!". Esse café é fatal. Se falar que o café é ruim, a verdade, perde o voto. Se mentir descaradamente, elogiando demais, perde o voto também. Candidato tem que mentir bem quando toma o café que lhe aparece.

Tem o café de comitê eleitoral, que na maioria das vezes é uma mesa cheia de copinhos descartáveis sujos de café e com a garrafa térmica sempre vazia. Esse café aproveita as campanhas eleitorais para plantar o pé, vai fazendo o seu pezinho e espalhando os seus frutinhos até depois das eleições. Cafezinho, pois mesmo adulto, continua nanico.


Nota do Editor: Carlos Augusto Rizzo mora em Ubatuba desde 1980, sendo marceneiro e escritor. Como escritor, publicou "Vocabulário Tupi-guarani", "O Falar Caiçara" em parceria com João Barreto e "Checklist to Birdwatching". Montou uma pequena editora que vem publicando suas obras e as de outros autores.
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