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SEÇÃO
Crônicas
06/01/2010 - 12h04
Como escrever?
Pedro J. Bondaczuk
 

O ato de escrever, principalmente quando seu objetivo não é o de se limitar a produzir textos perecíveis, que fiquem “velhos” praticamente no dia seguinte ao da sua produção, mas que se conservem sempre atuais, como se fossem escritos no dia em que você o ler (mesmo que o leia décadas depois de escritos), requer uma série de aptidões. Uma delas, talvez a principal, é a capacidade de despertar empatia no leitor, de torná-lo seu cúmplice, de fazê-lo sentir-se seu parceiro, embora sem o ser, por você ter redigido exatamente o que ele gostaria de redigir.

A isso, classifico de “astúcia”. Claro que a correção, quer (e principalmente) a gramatical, é condição sine qua non. Textos eivados de erros tendem a expô-lo ao ridículo, mesmo que seu conteúdo seja dos mais ricos e originais.

Você tem que criar um estilo próprio, todo seu, de escrever, de sorte que quem vier a ler suas produções literárias as identifiquem de imediato como suas, mesmo que seu nome não apareça sob o título. Embora não pareça, isso é muito mais difícil do que o leigo possa supor.

Bom ou mau (não me cabe julgar minha própria produção, até porque não teria a necessária isenção para fazê-lo), tenho a minha forma peculiar de redigir. Não temo, por exemplo, assumir minhas colocações sempre e invariavelmente na primeira pessoa. Há quem condene essa prática, acusando quem a adota de arrogante, imodesto, convencido e outros quetais. Bobagem. Entendo que se trate de manifestação de personalidade, de autoconfiança, de certeza quanto ao que escreve.

Meus textos (que caracterizo como crônicas, mas que os críticos juram que são ensaios), têm, todos, no aspecto formal, o mesmíssimo desenho. São como teoremas de geometria: começam com uma hipótese, da qual emerge determinada tese, seguida da respectiva demonstração. São, sobretudo, didáticos (vezo de um professor que, por “n” razões, conhecidas de todos, se recusou a abraçar o magistério).

Sou uma pessoa sumamente intuitiva e confio sem restrições na minha intuição. E esta me sugere que, mais dia, menos dia, haverei de me tornar, se não unanimidade, um escritor bastante requisitado, pelas idéias que veiculo. Convencimento? Não! Longe disso. É algo parecido, todavia positivo: é convicção.

Caso não estivesse convicto do meu valor, sequer me aventuraria neste complicado e não raro frustrante mundo das letras. É provável que sequer tenha a ventura de testemunhar meu sucesso. Não faz mal.

A probabilidade maior é que ele seja póstumo e aconteça muitos anos depois da minha partida deste mundo. Tudo bem, submeto-me a mais esta sacanagem das circunstâncias, se for preciso. Mas quando o sucesso vier... este texto, que hoje causa espanto em muitos e irritação nos hipócritas, irá testemunhar o quanto estou convicto do que faço e dos resultados que hão de advir disso.

O exercício do texto é solitário. Requer isolamento, silêncio e o que James Joyce classificava de “exílio”. É incompatível, portanto, com a exposição pessoal continuada, com os aplausos efêmeros, com a “glorícola” dos incompetentes, mas que se julgam os tais (há uma infinidade deles por aí). A obra, para se perpetuar, precisa ter um sem-número de características, entre as quais, conteúdo sólido e inteligente, passando pela clareza, concisão, exatidão do que é exposto e originalidade.

Posso, é verdade, ser original pisando as pegadas de outros escritores. Para isso, porém, preciso descobrir ângulos novos, inusitados, inexplorados no que já foi cansativamente explorado. Aí é que está o grande desafio de quem é, verdadeiramente, criativo. A originalidade, pois, não está no tema a abordar, mas na forma com que o abordamos.

O meu relativo sucesso de hoje, quando, graças à bendita internet, já sou lido em pelo menos dez países (conforme pude constatar pelo Google), será pífio, irrisório, medíocre face ao que pressinto que possa conseguir num futuro que não sei se será remoto, remotíssimo ou próximo.

Só peço a Deus a ventura de poder testemunhar pelo menos o início desse processo, cheio de idas e vindas, de quedas e recuperações sucessivas, de surpresas maravilhosas e decepções inesperadas. Para isso, porém, terei que manter autodisciplina, personalidade, convicção, além de contar com o fator sorte.

É pouco? É muito? Está além da minha capacidade? Não sei! O que sei é que o essencial, para que minha intuição seja verdadeira e não mero engodo da vontade e da imaginação (ou seria megalomania?) é jamais perder a “astúcia”, na hora solitária, dolorida e tensa em que estiver escrevendo.


Nota do Editor: Pedro J. Bondaczuk é jornalista, radialista e escritor. Trabalhou na Rádio Educadora de Campinas (atual Bandeirantes Campinas), em 1981 e 1982. Foi editor do Diário do Povo e do Correio Popular onde, entre outras funções, foi crítico de arte. Em equipe, ganhou o Prêmio Esso de 1997, no Correio Popular. Autor dos livros “Por uma nova utopia” (ensaios políticos) e “Quadros de Natal” (contos), além de “Lance Fatal” (contos) e “Cronos & Narciso” (crônicas), com lançamentos previstos para os próximos dois meses. Blog “O Escrevinhador” – pedrobondaczuk.blogspot.com.

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