Passados mais de vinte anos, de quando tive várias participações em campanhas eleitorais, com sucesso na renovação dos quadros políticos da Prefeitura e da Câmara Municipal de Ubatuba, por mais de uma vez, resolvi bater uma bola na campanha recente de 05 de outubro, a favor de um candidato a vereador muito querido que é meu filho. As coisas mudaram. Esqueci que sou do tempo que política era um instrumento apenas de prestação de serviços públicos para a comunidade, para o bem comum. Falava-se em corrupção, mas no interior e no litoral do Estado o pessoal não sabia quase nada sobre essa prática, e o voto era algo sagrado. A preocupação da Justiça Eleitoral em combater com propagandas o voto viciado por atos espúrios dos candidatos, chamando a atenção do eleitor para não trocar nem vender voto, foi lamentável, pois tal publicidade não se poderia julgar necessária. Um sinal de que ninguém agüenta mais a corrupção do voto. Se não bastasse a corrupção no erário público. Voto transacionado, voto comprado, voto negociado, era coisa presente no coronelismo nordestino, onde haviam os chamados currais eleitorais. No Estado de São Paulo, o voto sempre foi coisa séria, um direito exercido com dignidade, com esperança, com honestidade. Cada um sabia do seu dever social e cívico. Todos sabiam que um voto viciado prejudicava toda uma sociedade ou uma comunidade. Sabiam que o voto tem que ser consciente. Quem faz negócio com seu voto é miserável, pois não existe pior miséria do que vender um direito de tanto valor por qualquer moeda. Miserável porque não dá nenhum valor ao sonho de mudar, à esperança de viver em uma sociedade mais justa e mais realizada social e economicamente. Porque aliena um direito que representa o futuro de filhos e netos, e de gerações do porvir. Essa epidemia, infelizmente, já chegou em Ubatuba. Não vai ser fácil mudar, como não é fácil mudar nada que dependa de transformação social e cultural. Temos um eleitorado mesclado, meio a meio, de nativos e migrantes. Uma metade com suporte na cultura caiçara, a outra de origens diversas que não têm os mesmos anseios de constituição de uma sociedade política municipal com vistas para o passado, o presente e o futuro, com visão de progresso econômico, social e cultural. Estes, na maioria vivem em habitações precárias, sem recursos nem urbanos nem humanos, em vilas de situação econômica de fácil manejo. São alvo fácil das transações eleitorais. Parece que essa meia sociedade foi deixada assim, aumentando cada vez mais, como um depósito humano de garantias eleitoreiras. Senti nesse meio a indiferença política e social. Nenhum interesse por oposição política que mostre ou aponte desacertos ou corrupção. Uma massa humana congelada. Na maioria são pessoas boas, simples, pouco letradas, mas sem nenhum interesse político e social a não ser seus próprios interesses de sobrevivência. A meia sociedade caiçara parece que também perdeu o interesse de transformação social e de progresso, deixando a política de oposição à margem, só se preocupando com o interesse imediato de sobrevivência, por isso sem identidade política, melhor dizendo, identificando-se mais com a situação que pode trazer benefícios diretos ou individuais, a curto prazo. Nesse contexto fica difícil a pregação de uma Escola Política do Social e da Ética contra a Escola dos Interesses Individuais e da Corrupção. De uma escola política do Voto Santo, o voto limpo, consciente, e da escola do Voto Dourado, ou seja, o voto negociado com moeda, o voto trocado com prestação de serviços oriundos da máquina administrativa com benefícios individuais ou de minorias, onde o serviço público se torna uma máquina de fazer votos, com exploração dos extremamente pobres. Acrescenta-se a tudo isso a influência das Igrejas e Associações. Como isso pode mudar? Só Deus sabe. Talvez quando mudar a política e quando a Justiça Eleitoral conseguir ensinar, de fato, como se deve votar, como rejeitar o lixo político e como escolher candidatos. Observei que a sociedade ubatubense, em sua maioria aceita a política tanto dos partidos de centro-esquerda como de centro-direita. Condena a política de extrema esquerda ou de extrema direita. Muitos partidos da base política do Governo Central são bem aceitos e isso é um bom começo para as oposições. Pela substancia da campanha e pelo resultado das urnas, acredito que os votos anulados pela inexperiência do uso da máquina eletrônica pelo eleitor foi prejudicial a todos. O critério de se colocar primeiro o número do Vereador, depois o do Prefeito, atrapalhou muita gente. A única barreira no caso de Ubatuba será sempre a meia sociedade indiferente a qualquer mudança política e que faz a diferença, não se sabendo até que ponto as políticas dominantes desejam mudar esse fato social dando a essas pessoas pelo menos uma habitação digna e outros serviços básicos de melhoria urbana que os façam acreditar na existência de uma sociedade justa e politicamente conscientizada. Claudionor Quirino dos Santos Bacharel em Ciências Sociais e Jurídicas e advogado militante.
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