Depois que eu vi a carreta dos shows de campanha do atual prefeito consegui entender por que eles têm que soltar tantos rojões. São tantos artistas, tantas atrações interessantes que só soltando rojão para avisar que o candidato chegou. É hora de dar uma descansada, comprar um lanche esperar os políticos darem os seus recados e voltar para continuar vendo os shows quando novamente eles soltam rojões avisando que acabou o horário político. Em 1961 ajudei na campanha do Carvalho Pinto que era governador e apoiava Jânio Quadros para presidente. Lembro até hoje do logotipo da campanha, fundo azul com um pintinho amarelinho segurando uma vassoura debaixo da asa. Meu pai apoiava a campanha e cedeu uma sala para o comitê na nossa cidade. Empapelamos todas as paredes e passávamos o dia inteiro esperando os eleitores virem buscar as indicações de votos. Era proibido fixar cartazes fora do comitê, ou ficar distribuindo papéis pelas ruas e o auge da campanha foi o comício dos dois candidatos no coreto da única praça da nossa pequena cidade. Eu tinha sete anos na época, me lembro até hoje do momento em que apertei a mão de Carvalho Pinto e do distante cumprimento que recebi do Jânio. Meu filho mais novo está com oito anos e tem nos acompanhado nos comícios. Fico imaginando quais serão as lembranças que ele terá dos comícios que está vendo agora. Rojões? Ele verá e ouvirá muitos ainda. Conjuntos musicais? Ele verá e ouvirá muitos ainda. Promessas? Essa parte é uma caso à parte, para memorizar todas que já ouviu e ainda ouvirá pela vida afora nem sendo um superdotado. Pior, além de serem inumeráveis promessas elas são voláteis e mutáveis já durante a campanha, antes mesmo da eleição. Entendo por obras realizadas todas as conquistas que enriquecem uma cidade. Coleta de lixo não é obra é obrigação, manutenção de ruas também não é obra, do mesmo jeito que construir escolas. Hoje se um prefeito deixar algum aluno sem sala de aulas ele pode ir preso, então construir escolas é obrigação. As únicas conquistas dessa administração foram o corredor de bicicletas (aquilo não é ciclovia) na Oswaldo Cruz; A estrada do monte Valério, inconclusa; e a pedra fundamental do centro de convenções. "O Homem que Falava Javanês" é um conto do Lima Barreto e conta a história de um cara que estava na pior, devendo dinheiro para todo mundo e que a única saída que encontrou foi ensinar javanês sem saber uma só palavra da língua e leu num livro que Java era uma grande ilha do arquipélago de Sonda, colônia holandesa, e o javanês, língua aglutinante do grupo maleo-polinésico, possuía uma literatura digna de nota e escrita em caracteres derivados do velho alfabeto hindu deduzindo daí que dificilmente outro alguém em todo Rio de Janeiro soubesse falar javanês melhor do que ele. Vem o outro candidato, torrando dinheiro com pólvora, cas mesma parafernália de comício, cos rojão, cos conjunto, cas promessa. São tantas as promessas que a gente até se perde e fica sem saber onde, além de Ubatuba, ele vai conseguir colocar tantas obras. Do jeito que ele fala até parece que só ele tem todas as soluções para todos os problemas de Ubatuba e deixa claro o tempo todo que ele já está eleito. Num comício cinco hospitais, no outro um hospital com cinco alas. Meu filho não entendeu nada e me perguntou: "O que ele está falando?". - Javanês, meu filho. Ele está falando javanês.
Nota do Editor: Carlos Augusto Rizzo mora em Ubatuba desde 1980, sendo marceneiro e escritor. Como escritor, publicou "Vocabulário Tupi-guarani", "O Falar Caiçara" em parceria com João Barreto e "Checklist to Birdwatching". Montou uma pequena editora que vem publicando suas obras e as de outros autores.
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