Outro dia, um amigo meu foi parar na delegacia acusado de ato obsceno. Tudo começou quando uma gorda senhora, carregada de pacotes, levantou-se da poltrona do ônibus. Ao passar, meu amigo notou que o vestido da gorda senhora estava entranhado escandalosamente entre os seus (dela) grandes glúteos, expondo-a a um ridículo sem igual. Meu amigo, atenciosamente consertou a situação ajeitando-lhe, pela barra, o vestido. Envergonhado, depois do B.O. lavrado, explicou ao delegado: "Pensei que podia". Outro amigo meu já se deu bem com essa história do "pensei que podia". Tudo começou quando passeando pela Bienal de São Paulo, meu amigo, misto aturdido / assombrado tropeçou numa cunha de madeira. Irritado, e para evitar novos acidentes, retirou a cunha do caminho. A escultura modernista, sustentada pela cunha, balançou... balançou e desabou num efeito dominó despedaçando mais quatro dos trabalhos expostos. "Pensei que podia!" gritava meu amigo se defendendo da fúria dos irados artistas. Ele só saiu vivo porque o curador da mostra elogiou o resultado do acidente e prometeu votar na "criação coletiva" que acabou ganhando em primeiro lugar. O nome do meu amigo saiu em tudo o que é jornal, virou artista internacional. Já aquele meu primeiro amigo, acabou detido. Desta vez, acusado de atentado violento ao pudor. Aconteceu-lhe a mesma cena com a mesma gorda senhora. Ela passou por ele do mesmo jeito, com o vestido escandalosamente entranhado nos imensos glúteos. Meu amigo se conteve, ficou quieto, até cruzou os braços para se segurar melhor. Mas, o passageiro da frente resolveu ajudar a gorda senhora ajeitando-lhe, pela barra, o vestido entranhado. Antes mesmo que ela gritasse, meu amigo acudiu: - Ela não gosta que lhe mexam no vestido. E, com as mãos, meu amigo entranhou, cuidadosamente, o vestido nos grandes glúteos da gorda senhora. "Pensei que podia" lamentava meu amigo quando fui visitá-lo na cadeia. Já que estamos no assunto vou contar para vocês como outro amigo meu se deu mal com essa história do "pensei que podia". Cheio das incumbências resolveu sair por aí vendendo o principal produto do lugar que ele trabalhava. Enquanto ele batalhava pelo Brasil afora não deu problema algum, até ele resolver se aventurar pelos "estrangeiro", vender para o exterior também. Acontece que ele esqueceu de convidar a Natascha Romanoff (irmã do dono da firma) para participar das suas incursões globais e quando ele voltou todo anglicado, percebeu que estava enroscado, na sua ausência tinha sido "fritado", foi despedido sumariamente. - Assuntos pertinentes ao exterior, eu me incumbo, eles são de minha alçada, responsabilidade e eu adoooro! Gritava a Natascha causando inveja a qualquer matrona. - Pensei que podia. Lamentava meu amigo enquanto arrumava as malas da volta à sua terra natal. "Pensei que podia". Insistia.
Nota do Editor: Carlos Augusto Rizzo mora em Ubatuba desde 1980, sendo marceneiro e escritor. Como escritor, publicou "Vocabulário Tupi-guarani", "O Falar Caiçara" em parceria com João Barreto e "Checklist to Birdwatching". Montou uma pequena editora que vem publicando suas obras e as de outros autores.
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