Durante uma palestra para alunos da quarta série comecei a brincar com a percepção deles sobre as diversas cores nas plumagens das aves. É fácil. - Qual a cor da garça? Todos em coro: - BRANCA! - Qual a cor do tié-sangue? Alguns calados, outros: - VERMELHO! - Qual a cor do urubu? Todos em coro: - PRETO! E no final da falação, uma vozinha lembrou a todos: urubu tem duas cores. Silêncio geral. - Quais? Indaguei. - Ele tem branco nas pontas das asas que aparece quando está voando. Existe o observador nato, como revelou ser este menino, mesmo assim, observar é basicamente questão de treino. Nós que moramos neste país tropical, abençoado por Deus e bonito por natureza, temos a oportunidade de observar com privilégios. Nossas aves são exibicionistas e isto nos possibilita iniciar nossos avistamentos com facilidade e sem qualquer instrumento óptico, podemos ver a olho nu, perto de cem espécies diferentes. Isto é impossível nos climas frios, lá, qualquer aproximação há menos de 100 metros já provoca uma revoada. Por isso é que eles são obrigados a gastar tanto com instrumentos. Podemos iniciar observando a partir das janelas das nossas casas, imagine então, quantas aves podemos observar em todas as outras situações do nosso dia-a-dia. Já observei um gavião-peneira, “peneirando” sobre a Dutra. Ou um bando de tucanos atravessando a Rodovia Oswaldo Cruz perto da Comevap em Taubaté; num trecho feito de trem, na marginal Pinheiros, em São Paulo, contei 130 garças brancas, 4 garças-azuis, 10 biguás e um socó grande! Tudo sem usar binóculos. Certo dia, voltando de ônibus de São Paulo, um acidente na serra provocou um congestionamento de duas horas. Abri a janela, e fui anotando minhas observações. Quando o trânsito se normalizou quase todos no ônibus bufaram as diversas formas de se dizer um “até que enfim!”. Fiz as minhas contas e reclamei comigo mesmo: - Que coisa! Faltou uma espécie para inteirar 30. Sinceramente, não sei se torço por um novo congestionamento ou, se me contento com as 29 espécies anotadas.
Nota do Editor: Carlos Augusto Rizzo mora em Ubatuba desde 1980, sendo marceneiro e escritor. Como escritor, publicou "Vocabulário Tupi-guarani", "O Falar Caiçara" em parceria com João Barreto e "Checklist to Birdwatching". Montou uma pequena editora que vem publicando suas obras e as de outros autores.
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