A adoção de um sistema anticópia na televisão digital brasileira não será nociva apenas ao telespectador, que deixa de ter a liberdade de decidir o que vai fazer com a programação, como tornará a indústria brasileira menos competitiva. A opinião é do professor Ronaldo Lemos, diretor do Centro de Tecnologia e Sociedade (CTS) da Fundação Getúlio Vargas (FGV), que estuda a relação entre a propriedade intelectual e as novas mídias. Para o especialista, o bloqueio à gravação de programas no novo sistema de televisão fere a legislação. “A própria Constituição usa os termos livre e aberta para qualificar a televisão aberta e a lei de direitos autorais permite expressamente vários usos para a programação de TV”, comenta o professor. No final de maio, o Comitê de Desenvolvimento da TV Digital, composto por dez ministros, havia negado o pedido das emissoras para que os conversores que permitirão a recepção do sinal do novo sistema saíssem da fábrica com os dispositivos que impediriam a gravação de programas pelos telespectadores - como é feito hoje com as fitas de videocassete. Há duas semanas, o ministro das Comunicações, Hélio Costa, chegou a afirmar que o modelo digital deve contar com algum sistema de proteção dos direitos autorais dos produtores dos programas. Ele disse ainda que tinha feito um acordo com a ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, que coordena o comitê, para reverter a proibição dos bloqueadores. No dia seguinte, porém, a Casa Civil emitiu nota oficial confirmando que o pedido dos radiodifusores está sendo reavaliado, mas negou ter tomado qualquer decisão definitiva. O Ministério das Comunicações alegou que não se pronuncia sobre o tema. A Casa Civil informou à Agência Brasil que o caso vai ser analisado na próxima reunião do comitê, que ainda não tem data marcada. Na avaliação do professor da FGV, se o uso dos bloqueadores for aprovado, a televisão digital brasileira nascerá com atraso em relação a outros países. “Nos Estados Unidos, país que mais se preocupa com os direitos autorais e onde a TV digital é mais disseminada, o sistema anticópia não foi adotado”, observa. “Eles entenderam que há outras soluções que não violam os direitos fundamentais dos cidadãos.” Por meio da assessoria, a Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão (Abert) informou que a livre gravação dos programas criará empecilhos para futuros contratos de exibição. Isso porque a tecnologia digital, segundo a entidade, facilita a pirataria e não traz segurança aos produtores se os conteúdos serão vistos apenas pelo público-alvo. A Abert informou ainda que o sistema impedirá apenas a produção de cópias em série e não afetará quem grava determinado programa apenas uma vez. Ronaldo Lemos, no entanto, acredita que qualquer tipo de proibição para copiar programas da TV digital será inócua. “Como aconteceu com o DVD e está ocorrendo com o Blue Ray e o HD-DVD [novas tecnologias de reprodução de audiovisual], os códigos que fazem os bloqueadores serão facilmente contornados por uma série de mecanismos técnicos dominados por qualquer expert”, aponta o especialista. “Basta lembrar que o código que protegia o DVD foi quebrado por um garoto de 16 anos.” As conseqüências mais graves da instalação dos bloqueadores nos receptores digitais que serão comercializados a partir de 2 de dezembro, diz o professor, serão sentidas pela indústria nacional, que enfrentará a concorrência com a informalidade. “Esse tipo de medida incentiva o surgimento de um mercado paralelo que oferecerá conversores livres do sistema anticópia, mais atrativos para o consumidor”, destaca. Na opinião de Ronaldo, a adoção dos bloqueadores resultará na imposição de um padrão técnico específico para os fabricantes brasileiros, o que reduzirá a competitividade da indústria nacional. “A tecnologia anticópia isola a TV digital de outros equipamentos (como computadores e celulares) e cria uma barreira para o desenvolvimento de inovações no setor”, salienta
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