| CAR | | | | Euphonia pectoralis fêmea. |
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Estive lá no bairro do Camburi fazendo uma palestra sobre as aves de Ubatuba. Quando estava descendo pela estrada pensava comigo, como seria bom que pudesse encontrar alguém lá no bairro para receber os turistas estrangeiros que nos visitam. Cheguei esperançoso e fiquei espantado com o movimento de crianças. A II Festa do Verde organizada pela diretora Cati Maria Caromano, reuniu as escolas do Ubatumirim, Puruba, Picinguaba e Camburi. Aquela bagunça, saudável, própria de um monte de crianças era, per si, o verdadeiro significado da palavra vida. Depois da palestras tive a oportunidade de conversar com alguns moradores. Papo solto, sem compromisso, muitas brincadeiras e gozações. De repente me dei conta que até ali não havia visto uma ave sequer, que não havia ouvido um canto sequer e comentei com os moradores o silêncio que era no bairro. Percebi certa altivez ao falarem das aves do Camburi. Retruquei: - O Camburi está perdendo para a Praça Treze de Maio no centro da cidade, lá eu ouço e vejo muito mais passarinho do que aqui. Houve um certo incomodo. Contra-atacaram dizendo das aves que eles vêem por lá. - Vamos todos ficar quietos. O que estamos ouvindo? Nada! Cadê um bem-te-vi, um sabiá, um pardal!!! Um tico-tico, cadê? E para arrasar qualquer contra argumento: - Estou fazendo o levantamento das aves em todos os bairros de Ubatuba, tem bairro que a gente tem que esperar o bando de maritaca passar para poder continuar conversando, aqui esse silêncio, não tem pássaro nenhum!! O que está acontecendo? - Deve ser os rojões que, não sei por que, o pessoal solta muito por aqui. - Rojão estraga muito, mas não é só rojão, deve ter estilingue por aí. - Ah! Tem, e muito! A molecada é triste! - Triste é viver sem passarinhos igual vocês estão vivendo. Não sou eu, de fora, que tem que dizer, eu viro as costas eles voltam a estilingar, quem tem que dizer é a comunidade, vocês têm que decidir e escolher, educar a molecada ou viver nessa falta de alegria que é não ter passarinho cantando por aí. * A foto acima (tirada no Taquaral) é de uma fêmea de um arcádio (ferro-velho ou Euphonia pectoralis) visivelmente ferida e aleijada por pedrada. Mal se alimenta, pousa com dificuldades. Tornou-se presa fácil e nem deve nidificar. Aleijada não vai procriar. Quem a estilingou destruiu, sem matar, uma fêmea e, destruiu sem deixar nascer mais dez filhotes, pelo menos. É justo?
Nota do Editor: Carlos Augusto Rizzo mora em Ubatuba desde 1980, sendo marceneiro e escritor. Como escritor, publicou "Vocabulário Tupi-guarani", "O Falar Caiçara" em parceria com João Barreto e "Checklist to Birdwatching". Montou uma pequena editora que vem publicando suas obras e as de outros autores.
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