Devo confessar que quando criança dei muito trabalho para os meus pais. Fui daqueles moleques que levam os pais a suspirar lembrando Vinicius de Moraes (filhos, filhos, por que tê-los...) tanto que, minha mãe contratou uma babá alemã para cuidar dos filhos. Chamava-se Olga e era de uma severidade tedesca típica, volta e meia ela me colocava de castigo que ia de alguns minutos até alguns dias, tudo dependia da minha teimosia. Lembro que a maior razão dos castigos era quando eu insistia em falar palavrões. - Tem outras jeito de se falarr. Sempre me repreendia a fräulein. - Como posso xingar alguém de F.D.P., por exemplo? - Diga orriundo de relação extraconjugal não reconhecida pela casal. - Até terminar a frase, a raiva já passou. Respondia indignado - Este é o idéia, o raiva não faz bem parra os pessoas, menos ainda parra os crianças. Como já disse, fui moleque com PHD e volta e meia ia, com toda educação, perguntava à fräulein como dizer xingamentos, só para ver a cara dela ficar totalmente vermelha. - Como posso dizer viado? - Diga elementa com tendências sexuais diferrentes dos próprias do sua sexo. Respondia toda envergonhada. Fräulein tinha razão, até lembrar todas as palavras que teria que usar, a raiva passava, e a gente perdia a vontade de xingar, o que me evitou muitos problemas. Isto tudo aconteceu por volta de 1960, e devo reconhecer que a educação que recebi sempre foi positiva para o meu crescimento. Tanto que parei de usar muitos dos palavrões que usava naquele tempo. O problema é que hoje os palavrões são outros. Sinto falta da fräulein quando ouço os políticos, principalmente quando é ano eleitoral. - Não diga que Ubatuba está falida, diga a conjunturaeconomicofinanceirasocialmundial, é desfavorável ao turismo na praia Grande. - Não diga que o atual prefeito pode ser condenado a qualquer momento. Diga, que o atual prefeito é controverso, mas que tem bons advogados. - Não diga que o centro da cidade está uma vergonha, diga obras paralisadas por ordem judicial. - Não diga políticos. Diga, filhos da luta democrática. Tantos "não diga" que tenho saudades da fräulein. Pelo menos ela resolvia meus problemas no dia a dia, problemas que hoje sou obrigado a ver nas propagandas eleitorais sem poder fazer nada, nem xingar. - Não diga sessão extraordinária, diga pauta lotada. - Não diga que ainda não morreu gente suficiente para alguém se preocupar com as bicicletas, diga que mexer com as bicicletas não dá votos na reeleição do prefeito. - Não diga que Plano Diretor virou peteca. Diga que a lei 711 é a grande lei da vantagem. - Não diga que o prefeito vai preso se não construir escolas, diga, oh! Quantas obras! - Não diga que a secretaria de obras não faz nada. Diga lei de responsabilidade fiscal. Neste tipo de democracia, se isto tudo não é politicagem, não sei mais como reconhecer um verdadeiro filho da luta.
Nota do Editor: Carlos Augusto Rizzo mora em Ubatuba desde 1980, sendo marceneiro e escritor. Como escritor, publicou "Vocabulário Tupi-guarani", "O Falar Caiçara" em parceria com João Barreto e "Checklist to Birdwatching". Montou uma pequena editora que vem publicando suas obras e as de outros autores.
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