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Internacional
16/05/2006 - 14h02
A história recente do Haiti
Aloisio Milani - ABr
 
O país mais pobre das Américas

Após 202 anos da proclamação da independência do Haiti, a história de sua república negra pode ser contada por fatos marcantes, como a rebelião de escravos que libertou a ex-colônia francesa, mas também pela instabilidade política, recortada por ditaduras sangrentas e sucessivas interferências externas.

Durante a colonização, o antigo modelo de plantation, baseado no latifúndio para a monocultura da cana-de-açúcar destinada aos mercados europeus recrutou negros como escravos na África. A partir da liderança de Toussaint L´Ouverture, uma rebelião de escravos lutou pela independência do país em relação à França.

O período da Guerra Fria, polarizado entre Estados Unidos e União Soviética, foi marcado no Haiti por uma ditadura longa e sangrenta da família Duvallier. Primeiro, o presidente eleito Fraçois Duvallier, conhecido como "Papa Doc", ficou no poder amparado numa milícia violenta chamada Tonton Macoutes. Era a forma de reprimir os dissidentes políticos e possíveis novas forças de oposição.

Após sua morte, em 1971, seu filho Jean-François Duvallier, mais conhecido como "Baby Doc" assumiu o poder para manter o legado ditatorial no país. A situação perdurou até 1986, quando uma série de manifestações obrigou o ditador a deixar o país e se exilar na França. Já era então um movimento influenciado pelo líder religioso Jean Bertrand Aristide, adepto da teologia da libertação. O berço político de Aristide era a maior favela do Caribe, Citè Soleil, localizada ao norte da capital Porto Príncipe e ainda hoje uma região muito pobre e violenta.

Aristide despontou como nova liderança no país reprimido por anos de ditadura. Foi eleito com mais de 60% dos votos em dezembro de 1990. Contudo, sete meses após sua posse, militares tomaram o poder instalaram nova ditadura. Não há números corretos, mas os haitianos estimam que cerca de cinco mil partidários do Lavalas, partido de Aristide, foram assassinados nesse período.

O exílio de Aristide nos Estados Unidos ajudou a desencadear uma missão militar no governo Bill Clinton para restabelecer Aristide no poder. O ex-presidente aceitou implementar em seu retorno uma política conservadora na economia com base nos programas de ajustamento do Fundo Monetário Internacional (FMI).

A eliminação das tarifas de importação destruiu, por exemplo, a produção de arroz do país. Segundo dados da organização não governamental Oxfam, as importações do produto que eram de sete mil toneladas em 1985 passaram para 220 mil toneladas em 2002. O período comandado novamente pelo Lavalas teve continuidade com o presidente Renè Preval após 1995.

Em 1998, temendo novo golpe de Estado, o governo extinguiu por decreto, sem nenhum forma de compensação, o exército nacional. A partir de então, a Polícia Nacional do Haiti executa as funções de defesa, vigilância e repressão de crimes no país.

Quando Aristide estava novamente no poder, em 2004, uma série de manifestações armadas, marchando o interior para a capital Porto Príncipe, exigia a saída do presidente. Em fevereiro, os fuzileiros norte-americanos aterrisaram na capital e levaram Aristide para o exílio. Foi instituído um governo provisório e a ONU enviou uma missão de paz, que continua no país até hoje.

Com apoio de organizações internacionais, o Haiti realizou novas eleições gerais no início do ano. Após suspeitas de fraudes, o ex-presidente Renè Preval foi escolhido como o novo comandante do país pelo Conselho Eleitoral Provisório.

Haiti é país jovem, com alta taxa de desemprego e carente em educação

O país mais pobre das Américas conheceu, esta semana, o retrato de suas necessidades mais urgentes. Depois de 24 anos sem informações, foi divulgado o primeiro censo do Haiti, realizado pelo Fundo das Nações Unidas para População (UNFPA), pelo governo haitiano e com apoio de outros organismos internacionais. O resultado da pesquisa mostrou que metade da população do país, de um total de 8,5 milhões de pessoas, tem menos de 18 anos. Além disso, apenas 49% das crianças em idade escolar são atendidas pelo ensino fundamental.

Até então, grande parte das estatísticas sobre o Haiti vinham de amostragens, estimativas e projeções com base em informações antigas. Agora, por exemplo, sabe-se que o Haiti tem 33% de desempregados na população economicamente ativa – um dos piores resultados das Américas. Anteriormente, era impossível comparar com fidelidade o problema do Haiti com os países da região. A situação do desemprego da nação nem aparecia, por exemplo, nos anuários estatísticos da Comissão Econômica para América Latina e o Caribe (Cepal).

Outro dado apurado pelo censo é a mortalidade materna. A cada 100 mil nascimentos vivos, 523 mulheres morrem durante o trabalho de parto. É o pior panorama do continente. No ano passado, um ranking do Programa das Nações Unidas para Desenvolvimento (Pnud) mostrava que o Haiti estava na 153ª posição de um total de 177 países. A Organização Mundial de Saúde (OMS) considera como situação aceitável que ocorram entre seis e 20 mortes de mulheres por 100 mil nascidos vivos (no Brasil ocorrem 74,5 mortes, por exemplo).

"O censo oferece um mapa das necessidades mais urgentes do país", diz o representante do UNFPA do Haiti, Hernando Clavijo, em nota oficial das Nações Unidas. "A própria estrutura populacional, com maioria de pessoas jovens, significa que mais recursos devem ser alocados para educação e serviços de saúde reprodutiva."

A apuração do censo empregou 25 mil pessoas e custou, segundo as Nações Unidas, US$ 8 milhões. A execução da pesquisa foi feita pelo Ministério das Finanças do Haiti, com recursos do governo, do UNFPA e Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), União Européia, e Japão. Parte deste membros integram a comunidade de doadores que se comprometeu em repassar recursos para as áreas mais carentes do país.

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